Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Tu não viste

Pobres na Praia, Picasso, 1903

Tu não viste... aquela tumba suja,
Aquele chão donde a fome exalava;
Tu não viste a Natureza mãe e escrava,
A miséria à espera que a morte surja!

Aquele catre imundo, para morrer...
Ah! Aquela colher suja que tremia,
Mas não iria cumprir o seu vital dever.
A desgraça era tão fraca que nem comia!

Não viste as lágrimas sujas na face louca?
Agradeciam o que nunca lhes fora dado...
Ai, ter-te-ias, como eu,  envergonhado!

Terias, como eu, a voz funda e rouca...
Como se falasses de um segredo amaldiçoado.
Terias, talvez, escondido a tua face e chorado!


                                                                        Ana









Açores


   SOMOS, TALVEZ, «POBRES NA PRAIA» ...                                                                                

18 comentários:

Miguel disse...

Por vezes parece mais cómodo virar simplesmente a face para não ver. Se muitas das pessoas com responsabilidades - e quem poderá dizer que não as tem? - vissem aquilo que se passa diante dos seus olhos, o mundo seria de certeza diferente.

Laura disse...

E não e mais facil fingir que nao se ve ? http://www.youtube.com/watch?v=0JFX3L6r8BI

Eu tenho muitas saudades de estar ai tambem.
Grande beijinho

Dalva Nascimento disse...

Aninha,

teu lirismo expõe tão cruelmente essa vergonha que é a nossa indiferença...
Tocante e lindo poema, querida!

Bjs!

Unknown disse...

A irradicação da pobreza vai sendo feita mas muito lenta, lenta, lentamente.
É dramático!

O teu poema é exaltante.
Bjs

Unknown disse...

Claro que deverei pedir desculpa:
Quando escrevi «irradicação»

DEVERIA TER ESCRITO

ERRADICAÇÃO

Andradarte disse...

Que belo soneto Ana...
Espero por mais...
Beijo

Bípede Implume disse...

Querida Aninha
Tão pungentes,tanto as palavras como a miséria que ainda existe.
Beijinho e boa semana.
Isabel

Denise disse...

è..por vezes cegamos convenientemente..........calamos e nos deixamos ensurdecer.

afagos

Meg disse...

Ana,

Um poema tocante...
é que o claro - e aceite - aumento da pobreza é aviltante e uma vergonha para uma boa parte da Humanidade neste século.
E de tal maneira é já uma realidade que quase não nos damos conta de quão trágica é a sua dimensão.
Bem hajas pelo poema!

Beijinho para ti, Ana

vieira calado disse...

Um belo Picasso a emoldurar

um belo soneto!


Beijinho

Jorge Manuel Brasil Mesquita disse...

Um belo soneto que revela as muitas máscaras que se usam para mascarar a realidade.
Jorge Manuel Brasil Mesquita
Lisboa, 28/10/2010

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Minha querida amiga
Muito profundo e sentido este poema.
Por vezes é mais comodo virar as costas à miséria, infelizmente.

Beijinhos com carinho
Sonhadora

Maria Luisa Adães disse...

Belo poema!

Ainda bem que não vi
teria sofrido por nada fazer
mas sendo assim:

"Tomava o lugar dos indiferentes
e era igual a eles".

Mas ainda bem que não vi!

Beijos,

Mª. Luísa

Flor disse...

Lindo soneto.

Um beijo
Flor

Antoniatenea disse...

La pobreza qué difícil mirarla a la cara.. que fácil no mirar y no sentirnos responsables y seguir nuestra existencia sin implicarnos ni compartir.
Besos!!

Bípede Implume disse...

Querida Aninha
Beijinho de bom fim de semana.
Isabel

Cristina disse...

Bom fim de semana, Ana.Beijinhos.

Gerana Damulakis disse...

Que soneto, Ana! Vou reler, sonetos pedem releituras.