segunda-feira, 16 de fevereiro de 2015

«Está nas nossas mãos»

Knossos, Creta, Grécia - José Alves


LEGADO

Disse: creio na poesia, no amor, na morte
e por isso mesmo, creio na imortalidade. 
Escrevo um verso,
escrevo o mundo, existo; existe o mundo.
Da ponta do meu dedo mínimo corre um rio.
O céu é sete vezes azul. 
Esta pureza
é de novo a primeira verdade, a minha última vontade.

                                           YANNIS RITSOS, Grécia, 1901-1990
Tradução de Eugénio de Andrade



Yannis Ritsos, nome maior da poesia grega contemporânea,  nascido em Monemvassia (Grécia), a 1 de Maio de 1909 e falecido a 11 de Novembro de 1990, em Atenas.
Para além da literatura, destacou-se na luta armada contra a ocupação nazi da Grécia. 


Knossos, Creta, Grécia - José Alves



     VIERAM
com os galões dourados
     os galos do Norte e as feras do Levante.
E tendo repartido em duas a minha carne
     acabaram por se disputar pelo meu fígado
e foram-se.
     "Para eles", disseram, "o fumo do sacrifício,
para nós os fumos da glória,
     amén."
E o som enviado do passado
     todos o ouvimos e conhecemos.
Conhecemos o som e de novo
     de voz apertada cantámos:
para nós, para nós o ferro ensanguentado
     e a traição triplamente urdida.
Para nós a madrugada na caldeira
     e os dentes cerrados até à hora derradeira,
e o dolo e a rede invisível.
     Para nós o rastejar na terra,
a jura escondida na escuridão
     dos olhos, a crueldade,
sem nenhuma, nunca nenhuma Contrapartida.
     Irmãos enganaram-nos!
"Para eles", disseram, "o fumo do sacrifício,
     para nós os fumos da glória,
amén."
     Mas tu na nossa mão a candeia das estrelas
com a tua fala acendeste, boca do inocente,
     porta do Paraíso!
A vigência do fumo no futuro vemos
     jogo da tua respiração
e seu poder e reinado!

                        de Louvado Seja (Áxion Estí)
tradução portuguesa e posfácio de 
Manuel Resende, Assírio e Alvim, 2004.

Odysséas Elytis é um poeta grego falecido em 1995. Recebeu o prémio Nobel em 1979.
Áxion Estí, publicado em 1959, é um poema nacional no qual o poeta, inspirado na tradição, revê a história da Grécia com todas as suas vicissitudes e anseia por um renascimento. E, como ele disse no Discurso do Prémio Nobel:

"No fundo, o mundo material é um puro amontoado de matéria. A construção final depende da nossa qualidade de arquitectos. O paraíso ou o inferno. Se a poesia contém uma garantia e isto nestes tempos sombrios, é precisamente esta: que o nosso destino, apesar de tudo, está nas nossas mãos."
 In Posfácio a Áxion Estí de Manuel Resende.


Museu de Heraklion, Creta - José Alves


Mais poemas gregos:





Knossos, Grécia - José Alves



15 comentários:

  1. Não é a primeira vez que nos traz poetas e arte de países outros... Obrigado por isso...

    Um beijo amigo

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  2. OI ANA!
    BONITAS ESCOLHAS PARA TRAZERES A NOSSO CONHECIMENTO, OBRAS E POETAS GREGOS, MUITO BOM.
    ABRÇS

    http://zilanicelia.blogspot.com.br/


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  3. ~
    ~ ~ Gratíssima pela excelente partilha, Ana.

    ~ ~ Dias plenos de sucesso e harmonia. ~ ~
    ~ ~ ~

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  4. Poetas gregos. Gosto imenso. A minha solidariedade com o povo grego...
    Beijo.

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  5. "Da ponta do meu dedo mínimo corre um rio."
    E no meu punho fechado existe
    um mar o acolhe...

    Ah, o tão pouco que sabemos
    dos nossos irmãos gregos.

    Obrigado

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  6. Improváveis somos todos nós
    firmes na espuma das águas
    um rio com duas margens
    quando um belo barco passa
    por uma nesga de sol

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  7. sim, em sintonia, minha querida amiga!

    e fico feliz por isso...

    "les beaux esprits..."

    beijo

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  8. Bonitos poemas.

    Isabel Sá
    https://brilhos-da-moda.blogspot.pt

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  9. lindo, obrigada pelo link e pelos conhecimentos! Beijos

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  10. Está nas nossas mãos !

    E nós temos que lhes dar a mão,hoje por eles, amanhã por nós.
    A minha total solidariedade para com o povo grego.
    Guardei o link com profundo agradecimento amiga Ana.

    beijinho


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  11. está nas nossas mãos, mudar!
    para melhor o que está mal
    faça-o quando for votar
    para bem dos pobres de Portugal.

    Somos um povo humilde,
    o melhor aluno da união
    que disso ninguém duvide
    aplaudimos quem nos tira o pão!

    Desejo para você amiga Ana, uma boa tarde, um beijo,
    Eduardo.

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  12. Querida Aninha
    Não estava, de todo, familiarizada com a poesia grega. Gostei muito, mesmo.
    Já com os poetas africanos já me sinto mais em casa. Tenho todas as antologias publicadas pela Casa dos Estudantes do Império. Conheço-os quase de cor. Para além de Alda Lara há uma poetisa moçambicana, Noémia de Sousa que é, também enorme.
    Estou solidária com os gregos como não podia deixar de ser.
    Beijinhos.

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  13. Boa tarde, publicação bela e oportuna, sou solidário com o povo Grego e com toda a esquerda Europeia.
    AG

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  14. Querida Amiga

    A minha alma sente-se em festa com esta tua publicação-um post de luxo.
    Sim, está nas nossas mãos honrarmos o passado, as raízes da nossa civilização, e definir o nosso rumo.

    Beijinhos

    Olinda

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