quinta-feira, 25 de abril de 2024

Abril

Foto: Félix Esteves - 25 de Abril de 1974



 
Havia uma lua de prata e sangue
em cada mão.

Era Abril.

Havia um vento
que empurrava o nosso olhar
e um momento de água clara a escorrer
pelo rosto das mães cansadas.

Era Abril
que descia aos tropeções
pelas ladeiras da cidade.

Abril
tingindo de perfume os hospitais
e colando um verso branco em cada farda.

Era Abril
o mês imprescindível que trazia
um sonho de bagos de romã
e o ar
a saber a framboesas.

Abril
um mês de flores concretas
colocadas na espoleta do desejo
flores pesadas de seiva e cânticos azuis
um mês de flores
um mês.

Havia barcos a voltar
de parte nenhuma
em Abril
e homens que escavavam a terra
em busca da vertical.

Ardiam as palavras
Nesse mês
e foram vistos
dicionários a voar
e mulheres que se despiam abraçando
a pele das oliveiras.

Era Abril que veio e que partiu.

Abril
a deixar sementes prateadas
germinando longamente
no olhar dos meninos por haver.


José Fanha, Lisboa, Portugal
(Do livro ainda inédito "Tempo azul")


“Estaria naturalmente muito preocupado” — Natércia Salgueiro Maia recorda o marido 50 anos depois da Revolução.

Meio século depois, a mulher de Salgueiro Maia lembrou o capitão de Abril e falou sobre o atual panorama que Portugal se encontra a viver. (Fonte: SIC)

14 comentários:

  1. E era abril, 25, há 50 anos atrás.
    Feliz dia da liberdade! beijos, chica

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  2. E era abril, 25, há 50 anos atrás!

    Feliz dia da liberdade! Deve sempre ser festejada! beijos, chica

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  3. Esta foto que encima o post deve ser das mais emblemáticas deste dia de há 50 anos.
    Nela podemos ver Salgueiro Maia, através do megafone, fazer o pedido de rendição ao então Presidente do Conselho que se havia aquartelado no quartel do Largo do Carmo, juntamente com outros membros do seu Governo.

    Gostei muito deste invulgar e inédito poema de José Fanha.

    Naturalmente, como bem referiu a esposa do capitão de Abril, este só poderia estar bastante preocupado com tudo o que acontece e tem acontecido, depois deste dia, se tivesse tido a felicidade de viver até à data cinquentenária, mas Deus não quis.

    Um belo trabalho de recolha a marcar este dia histórico, Ana.
    Um abraço.

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  4. "Era Abril que veio e que partiu."

    Fanha, antecipou; nesse verso, o que disse Natércia Salgueiro Maia


    Beijo

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  5. Querida Ana

    Gostei muito o poema de José Fanha,
    para festejar os 50 anos da Revolução
    de 1974.
    Salgueiro Maia o capitão impoluto.
    Sempre que se fala da Revolução o seu
    rosto e postura se impõem.

    Beijinhos
    Olinda

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  6. É fabuloso, o poema de José Fanha.

    Todos nós, que lançámos um grãozinho de areia para o cimento da construção de Abril, estamos naturalmente muito preocupados.

    Um beijo, Ana!

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  7. Muito belo!

    Abril..., outra vez. Que novos versos floridos se escrevam!


    Beijinhos.

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  8. Lindo homenaje . Lindo poema. Te mando un beso.

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  9. Abril celebra a Liberda, festeja a Democracia e, de cravo na mão, faz a revolução que não tarda e cala o fogo no cano da espingarda.
    Abraço de paz e amizade.
    Juvenal Nunes

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  10. Boa tarde, um excelente domingo e um bom início de semana Ana. Nosso outono em abril, parece mais o verão. Grande abraço carioca.

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  11. Querida Ana,
    A liberdade de um povo e a volta da sua democracia é realmente algo para celebrar, aqui no Brasil como em Portugal e diversos outros países viveram ditaduras sangrentas e o fascismo tomando conta das suas nações. Felizmente na maioria desses países antes dominados por militares conseguiram se livrar desse terrível mal e hoje vivem períodos democráticos e de liberdade de expressão. Fascismo nunca mais, ditadura nunca mais!
    Um beijo!

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  12. Este poema do Fanha é muito bom.
    Salgueiro Maia foi um desbloqueador paciente e firme quando as coisas estiveram tremidas. A ele se deve muito do êxito da revolução e de não ter sido derramado sangue, como é habitual neste tipo de golpes militares.
    Boa semana.
    Beijo.

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  13. Era Abril. E nós acreditámos que seria a vida toda...
    Um belíssimo poema de José Fanha.
    Uma boa semana, minha Amiga Ana.
    Um beijo.

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  14. Gostei de ler o belo poema de José Fanha.
    Lembro-me da esposa de Salgueiro Maia contar que o marido lamentava-se
    dizendo que lhe parecia que os portugueses não gostavam dele...
    Depois de 50 anos de ditadura e tanto sofrimento, o povo pedia vingança...
    Lembro-me que na altura, fiquei dececionada, pois pensava que o governo
    da ditadura cessante deveria sair mais humilhado...
    Muito lamento que tenha partido tão precocemente, todas as homenagens
    são poucas.
    Um abraço grande, até o meu regresso.
    ~~~~~

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