Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2023

Dias assinalados...máscaras

 

Pablo Picasso – Garota em frente ao espelho, 1932


Depus a máscara e vi-me ao espelho. —

Depus a máscara e vi-me ao espelho. —

Era a criança de há quantos anos.

Não tinha mudado nada...

É essa a vantagem de saber tirar a máscara.

É-se sempre a criança,

O passado que foi

A criança.

Depus a máscara e tornei a pô-la.

Assim é melhor,

Assim sou a máscara.

E volto à personalidade como a um terminus de linha.

18-8-1934

Poesias de Álvaro de Campos. Fernando Pessoa. Lisboa: Ática, 1944 (imp. 1993).

  - 61.

Lapso corrigido segundo: Álvaro de Campos - Livro de Versos. Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993.


Arroz doce

Ainda assim é... mesmo que não aprecie minimamente o Carnaval...
Depois de ter estado em Nice  e em Veneza, a memória deste dia habita a minha cozinha de infância, algures no Alto Alentejo. Aprecio a simplicidade, a emoção que vem de um tempo remoto a qual se estilhaça, dia após dia, nesta sociedade espectáculo. E... a minha mão alentejana reproduz a tradição...


Filhós
    
A máscara da palavra

A máscara da palavra
revela-esconde
o rosto vago
de um sentido mundo

Paraíso acidental
metódico exercício
a máscara da palavra
colou-se ao rosto:
agora é
o nosso mais vital artifício

Com a máscara da palavra
reinventamos
o som da voz amada
que nos inunda
com seu luar de espuma 

Ana Hatherly, in A idade da escrita, 1998


   

13 comentários:

chica disse...

Ambas poesias lindas,bem trazidas e escolhidas! Gostei dos apetitosos doces! beijos, ótimo dia,tudo de bom,chica

- R y k @ r d o - disse...

Belas palavras poéticas. O arroz doce e as filhós deixaram-me a salivar de gulosice.
.
Feliz terça-feira de Carnaval. Saudações cordiais.
.
Poema: “” É Carnaval: Brinque-se … ””…
.

Maria João Brito de Sousa disse...

Que bom ler estes dois esplêndidos poemas depois de uma tão longa ausência. :)

Não, nada me diz o senhor Carnaval, pelo menos desde a minha adolescência. Quando era menina, gostava que me vestissem de "violetera" ou mesmo de limpa-chaminés... Agora sou só palavras e muito, muito raramente as uso como máscara.

Um beijo



AC disse...

Máscaras aqui, máscaras ali, máscaras por todo o lado. Mas, como contraponto, também existem os leitores de máscaras. E alguém os ouve?

Excelente post, Ana!

Um beijinho :)

Guma disse...

Ainda há lugares (raros) em que o carnaval tem a máscara cultural que nos pertence.
Máscaras há que são obras talentosas de artesãos que também não sei por quanto tempo mais terão continuidade ou se desaparecem como outras tradições que se perdem.
Já de tuas mãos, admiro as imagens e faz-me crescer água na boca. Vê-se com que dedicação e amor foram feitos.
.
Boa poesia que alimenta o espírito.
Uma pena não conseguir deitar a mão aos doces 😊 que me alimentaria a gulodice 😊
Beijinho / Kandando

Graça Pires disse...

Um post que é um luxo, minha Amiga Ana.
Dois poemas maravilhosos de poetas eternos.
Levo uma taça de arroz doce. Posso?
Tudo de bom para si.
Um beijo.

São disse...

Também comi arroz doce ontem, feito pele minha tia. Que eu não sou dada a artes culinárias nem vivi no Alentejo. Como diz o nosso querido Guma , "pena não conseguir deitar a mão aos doces".

Escolheste bem os poemas, como é hábito.

As tradições , vão-se desvanecendo-se...

Minha amiga, beijinho e bom resto de semana :)

Roselia Bezerra disse...

Boa noite de paz querida amiga Ana!
Aprendi a fazer filhós com uma religiosa que viveu na Itália. É muito gostoso.
Do belo poema primeiro, eu apreciei muito dois versos que me disseram muito, se é criança quando se sabe tirar a máscara.
Tão perfeito!
Com razão, minha criança interior está tão entranhada em mime ela sou eu.
Tenha dias abençoados!
Beijinhos

Caderrno de San disse...

Bateu uma saudade e vim te ver, Ana. Por intuição. Pois, encontro dois poetas que não podem ser esquecidos e dois poemas que se adequam aos dias. O que mais ainda alegra? Como disse a amiga Graça Pires, também posso levar uma taça de arroz?
Fraternal abraço, Ana!

Klaudia Zuberska disse...

Interesting post, I enjoyed reading it. I love blogs with passion and heart :)
Greetings from Poland!

Olinda Melo disse...


Querida Ana

Trouxeste Álvaro de Campos e Ana Harthley, dois poetas que
habitam o meu "Xaile", com o seu talento e modo de
escrever, interpretando e reinterpretando o palco da vida.

Penso que nunca publiquei este poema de A.Harthley.

Conjugaste-os muito bem, com um feito harmonioso.

E a infância, os usos e costumes, os cheiros e a Mãe...

Beijinhos
Olinda

Maria Rodrigues disse...

Dois belos poemas de dois grandes poetas Álvaro de Campos e Ana Harthley.
Que aspecto delicioso tem o arroz doce e as filhós.
Beijos e bom fim de semana
Maria

Juvenal Nunes disse...

Podemos, talvez, concluir que apenas mascaramos a criança que habita dentro de nós.
Abraço amigo.
Juvenal Nunes