Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

quinta-feira, 11 de março de 2010

RELER CLÁSSICOS

José Alves / Açores, Terceira


«A Tranquilidade da Alma não se Alcança em Viagens

Pensas que só a ti isso sucedeu; admiras-te, como se fosse um caso raro, de após uma tão grande viagem e uma tão grande variedade de locais visitados não teres conseguido dissipar essa tristeza que te pesa na alma!? Deves é mudar de alma, não de clima. Ainda que atravesses a vastidão do mar, ainda que, como diz o nosso Vergílio, as costas, as cidades desapareçam no horizonte, os teus vícios seguir-te-ão onde quer que tu vás. Do mesmo se queixou um dia alguém a Sócrates: «Porquê admirar-te da inutilidade das tuas viagens,» - foi a resposta, - «se para todo o lado levas a mesma disposição? A causa que te aflige é exactamente a mesma que te leva a partir!» De facto, em que pode ajudar a mudança de local, ou o conhecimento de novas paisagens e cidades? Toda essa agitação carece de sentido. Andares de um lado para o outro não te ajuda em nada, porque andas sempre na tua própria companhia. Tens de alijar o peso que tens na alma; antes disso não há terra alguma que te possa dar prazer!

Temos de viver com essa convicção: não nascemos destinados a nenhum lugar particular, a nossa pátria é o mundo inteiro! Quando te tiveres convencido desta verdade, deixará de espantar-te a inutilidade de andares de terra em terra, levando para cada uma o tédio que tinhas à partida. Se te persuadires de que toda a terra te pertence, o primeiro ponto em que parares agradar-te-á de imediato. O que tu fazes agora não é viajar, mas sim andar à deriva, a saltar de um lado para o outro, quando na realidade o que tu pretendes - viver segundo a virtude - podes consegui-lo em qualquer sítio».

Séneca, Cartas a Lucílio

Ana Tapadas

13 comentários:

Sonhadora (Rosa Maria) disse...

Ana
Lindo texto...muito verdadeiro.
Para todo o lado, vamos connosco.

Beijinhos
Sonhadora

Gerana Damulakis disse...

Nossa, não consigo concordar.

Ana, minha linda, um beijo grande.

Sofia Carvalho disse...

Ana, sem dúvida uma grande verdade:
Temos de viver com essa convicção: não nascemos destinados a nenhum lugar particular, a nossa pátria é o mundo inteiro...
Lindo!
Beijinhos querida e uma bom fim de semana

MARU disse...

Cuantos anos faz que sussederam estas coisas, aconselhadas por Séneca e Täo sabias e actuáis säo agora.
E é que o homem, sempre foi o mesmo, com a mesmas debilidades, dúvidas e medos.

Näo podemos esconder a cabeça. Melhor é arrumar os problemas frente a frente con valentía.
E depois, podemos ir donde queramos....Seremos felices, pois deixaremos enterrados nossos problemas e viajaremos como o vento....

Muito bonito post.
Um beijo grande, amiga.

nydia bonetti disse...

Não conhecia este texto Ana. Concordo em parte. Viajar faz um bem danado, mas não preenche mesmo os vazios existenciais. Também não sei se o mundo todo é nossa Pátria, ou se somos estrangeiros em qualquer parte, porque não somos daqui. Tão bom ler textos assim, que nos inquietam e instigam. Abraço!

Ana Tapadas disse...

Nilson Barcelli

Não vale a pena viajar para fugir de nós próprios.
Palavras sábias, num pequeno texto, que é grande em conteúdo.
Querida amiga, obrigado pela partilha.
Bom fim de semana, um beijo.

Ana Tapadas disse...

Nilson, meu amigo:
Por algum motivo, não consegui moderar o teu comentário.
Publiquei, assim mesmo.
As minhas desculpas e um beijinho.


* Claro: pretendi a inquietação, como sempre. Não sou adepta de unanimismos.
Obrigada a todos.

duarte disse...

eu só pertenço aqui...
abraço para a planície

Unknown disse...

Belíssima edição Ana.

O problema é que associada a muitas necessidades, um delas -- Indissociável da natureza humana -- é a transumância.

Temos de nos deslocar.
Há que fazê-lo
Mesmo bocejando.

Os traços de carácter são tão vincados que, quanto muito evoluem -- Pior será se no sentido do agravamento dos piores atributos -- mas raramenre se transformam... Para uma certa ideia de bem, belo e pergeito.

Saudações

Andradarte disse...

Cem por cento de acordo com todo
o artigo. Porquê?.....por diversos motivos de que não me orgulho...
Beijo

vieira calado disse...

Olá, boa noite!


Hoje apenas para lhe pedir para ler a minha postagem a desvendar o blá blá blá, da anterior.

Bjs

Fernando Campanella disse...

Viajamos em busca do que, de certo maneira, já existe dentro de nós. Viagens são para mim um tipo de reencontro.
Obrigado, pelas aguardadas visitas em meu blog. E meus sentimentos, Aninha, pelo passamento de teu amigo. Bjos.

http://saia-justa-georgia.blogspot.com/ disse...

Sensacional!

Boa semana

Um beijao