Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

domingo, 19 de maio de 2013

Trovoadas do Sul...

Flor da Rosa, Crato, José Alves-2013
Eu, professora, me confesso e podeis culpar-me da tristeza fria desta Primavera. A sanha dos governantes bem pode investir contra o muro secreto dos meus sonhos enquanto o teu olhar contiver os lampejos do futuro. Outros me antecederam na escrava tarefa do pedagogo. 
Flor da Rosa, Crato, José Alves-2013
Eu, professora, me confesso de todos os Domingos de árduas tarefas e das noites longas de trabalho sem repouso. Podeis culpar-me de todos os fracassos e dos longos silêncios dos cobardes. Hei-de deitar-me exausta, mas acordarei com um sorriso, porque o meu labor é urdir a esperança.
Alto Alentejo, José Alves-2013
Eu, professora, me confesso na sanha destes dias sem futuro. Podeis igualar-vos na malícia ambiciosa do poder, mas o vosso espírito viajará eterno para um lugar impuro. Para a malévola morada dos corruptos onde as cores do Verão se hão-de instalar numa qualquer curva da História que, hoje, esqueceis.
Flor da Rosa, Crato, José Alves-2013
Eu, professora, me confesso de resistir ainda aos cortes sucessivos da crueldade e do destino que escolheste para mim. Podeis roubar-me o sossego, mas jamais cortareis essa capacidade indecifrável de amar os outros e de os querer mais justos e mais humanos, de os armar com o passado para que possam questionar o futuro.
Flor da Rosa, Crato, José Alves-2013
Eu, professora, me confesso deste céu carregado de trovoadas do sul e do ribombar de todas as culpas dos homens fracassados. Podeis acusar-me da exigência que pratico e da distância que instalo entre os abutres que se aprazem na chacina e os homens que sonham o Futuro.


                                                                                      Ana



14 comentários:

JP disse...

Que lindo Ana....

Sabes, esta é a profissão mais antiga que existe. Não, não é a outra, é esta. Nunca deixes de amar as pessoas, de as fazeres mais justas, e de teres o carinho e força que tens.

Esses jericos que nos governam não sabem, nunca saberão o que é ser assim, sentir assim.

Beijinho

irneh disse...

Um texto forte, sentido, de alguém que ama o que faz e que sabe o que faz. Sempre soube.
Beijinhos

Ana Tapadas disse...

Obrigada, IRNEH. Vindo de uma colega, tenho que agradecer aqui. Comentários assim são hoje coisa rara entre colegas.Tu sabes.

Beijinho, minha amiga.

Rogério G.V. Pereira disse...

Para aconchego dessa tua alma em penitência, posso dizer-te que ainda hoje recordo os meus professores que souberam sê-lo...

Jorge disse...

Amiga Ana,
Para mim os professores sempre foram um exemplo paradigmático de devoção e dedicação. Sempre tive por eles a maior admiração e respeito. Compreendo o desabafo da sua confissão. Acredito também que as trovoadas um dia deixarão de ribombar e teremos dias mais esperançosos.
Abraços,
Jorge

São disse...

Oh, Ana, que maravilha de texto!!

Os abutres podem roubar-nos tudo, mas nunca a dignidade e o amor que temos pela profissão nem o gosto de ensinar!

Gosto, gosto mesmo de ti!

Da Flor da Rosa sempre me agradou o nome, que é um achado de beleza e a terra também aprecio.

Abraço estreito. como desejo de boa semana

O Puma disse...

A esperança também se cultiva

na delicadeza do seu texto
em riste

Margarida disse...

Venho deixar-lhe um beijo com saudades. Nunca deixe de depositar no que faz toda a sua paixão, é isso que faz de si a grande mestra que eu nunca esquecerei.

Beijo,
Sara

Lídia Borges disse...


Confesso a minha comoção porque sei o tamanho exato do que diz. E a forma como o diz, reafirma a dignidade da maioria dos profissionais da Educação (diga-se) que se eleva muito acima da mesquinhez e grosseria de quem, neste momento, (des)governa o país.

Um beijo

Manuel Veiga disse...

sensivel, comovente, oportuno texto.

bravo.

beijo

Fê blue bird disse...

Amiga Ana, estou profundamente comovida com este teu desabafo, com este teu SENTIR!
Estou contigo nesta luta pela dignidade da mais nobre e bela profissão do mundo.

beijinho

Pérola disse...

Já mais aliviada?

Só não entendo porque têm de fazer greve e prejudicar os alunos.

Prejudiquem o governo, os miúdos não têm culpa.

Devia ser para eles a vossa prioridade.

Como mãe desempregada estou triste...com os governantes e também com os professores.

Só eu não posso fazer greve...

Beijinho e desculpa o desabafo, mas este país parece saído de uma história de horror.

Bípede Implume disse...

Querida Aninha
Eu, mãe de duas professoras,te agradeço.
Lindo, forte, vindo do fundo da alma.
Tenho que voltar ao Crato, ora se tenho.
Beijinho de muita amizade.
Isabel

Fá menor disse...

Só digo que estas imagens são belíssimas. E é só por isso que te posso culpar :)

Bjs