Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

sábado, 24 de novembro de 2012

Hino à Razão


Rapto de Europa, Fresco em Pompeia

Razão, irmã do Amor e da Justiça,
Mais uma vez escuta a minha prece.
É a voz dum coração que te apetece,
Duma alma livre, só a ti submissa.

Por ti é que a poeira movediça
De astros e sóis e mundos permanece;
E é por ti que a virtude prevalece,
E a flor do heroísmo medra e viça.

Por ti, na arena trágica, as nações
Buscam a liberdade, entre os clarões;
E os que olham o futuro e cismam, mudos,

Por ti, podem sofrer e não se abatem,
Mãe de filhos robustos, que combatem
Tendo o teu nome escrito em seus escudos!


Antero de Quental


Desde menina que gosto de decorar poemas de Antero. Há na sua poesia, como na de Herculano, um tom elevado que me atrai profundamente, como se as palavras conservassem ainda o valor do Ideal.
No cinzentismo desde dia e destes tempos, só Antero me inspira ainda, mesmo se lendo notícias por aí as vejo ilustradas assim:


Hélas!

Ana


quarta-feira, 21 de novembro de 2012

@migos

José Alves


O mês de Novembro pode ser muito triste. Tem brumas e sonhos e frios inesperados. Tem luzes e sombras que tudo cobrem de surpresa. E tem dias cinzentos que se alojam no mais profundo de nós.
@migos vêm até nós, sem rosto, sorrindo. Depois, partem para sempre. Um dia partiu os Cesc (http://cescginesta.blogspot.com) da sua Catalunha natal. Agora partiu Christine (http://alzira.canalblog.com)...através dela conheci recantos de Bruxelas, como só o seu olhar podia retratar.
Ficamos, então, a sentir que a Amizade existe para lá do rosto e do encontro físico. A fraternidade está onde colocamos o nosso coração.

A vida é frágil, mas perfumada como os meus jasmins outonais.

Cultivemos, pois, a @mizade, meus queridos amigos.

José Alves

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

O Profeta e os homens

Ismail Shamut, Palestina


NA CASINHA DA RUA HALAFTA

Na casinha da Rua Halafta
as tardes passam tranquilamente.
Amigos vêm, partem e sabem ao odor da mirra.
Na copa da palmeira há uma coroa de chuva transparente.
As rosas quase que irrompem para dentro de casa.
E nestas tardes de infinito outono, estou sempre no terraço,
a observar as luzes de Talpiot em frente,
pensando em que estações estarás agora, 
e em como desapareceste, como transcorreu a vida.

 Rami Saari (Israel)

*****

ELE É CALMO E EU TAMBÉM

Ele é calmo,
E eu também.
Ele bebe chá de limão,
e eu bebo café.
(esta é a única coisa diferente entre nós)
Ele, como eu, usa uma camisa folgada básica
E eu olho, como ele, para uma revista mensal.
Ele não me vê enquanto eu o olho discretamente;
Eu não o vejo enquanto ele me olha discretamente.
Ele é calmo,
E eu também.
Ele pede algo ao garçon;
Eu peço algo ao garçon.
Um gato preto passa entre nós,
E eu toco sua noite de pêlos;
Ele toca sua noite de pêlos.
Eu não digo: «o céu está claro hoje,
mais azul»;
Ele não me diz: «o céu está claro hoje.»
Ele é o visto e o que vê;
Eu sou o visto e o que vê.
Eu movo minha perna esquerda;
Ele move sua perna direita;
Eu balbucio a melodia de uma canção;
Ele balbucia a melodia de uma canção.
Eu penso: «Ele é o espelho onde eu me vejo?»
Então eu olho-o  nos olhos e não o vejo.
Deixo o Café com pressa.

Penso: talvez ele seja um assassino,
ou talvez seja apenas um homem passando
e eu seja um assassino.

Mahmoud Darwish (Palestina)


 David Gerstein, Israel



segunda-feira, 12 de novembro de 2012

You Are Welcome To Elsinore

 Pawla Kuczynskiego

Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam

e podem dar-nos morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício


Ao longo da muralha que habitamos
há palavras de vida há palavras de morte
há palavras imensas, que esperam por nós

e outras, frágeis, que deixaram de esperar
há palavras acesas como barcos
e há palavras homens, palavras que guardam
o seu segredo e a sua posição


Entre nós e as palavras, surdamente,
as mãos e as paredes de Elsinor


E há palavras nocturnas palavras gemidos
palavras que nos sobem ilegíveis à boca
palavras diamantes palavras nunca escritas
palavras impossíveis de escrever
por não termos connosco cordas de violinos
nem todo o sangue do mundo nem todo o
amplexo do ar
e os braços dos amantes escrevem muito alto
muito além do azul onde oxidados morrem
palavras maternais só sombra só soluço
só espasmo só amor só solidão desfeita


Entre nós e as palavras, os emparedados
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar



                                                             Mário de Cesariny

Pawla Kuczynskiego

sábado, 10 de novembro de 2012

Persona non grata

António Reyna Manescau


Os tempos difíceis do Sul não destroem a alma das minhas gentes.
Há nas chuvas e no frio o rumor do vento que se espalha na planície. O rigor dos dias agitados não nos tornou tagarelas. As palavras têm a medida necessária. Sabemos que a explosão se tece no silêncio e que o frágil equilíbrio é o segredo de uma vida serena. 
Assim, não organizem tardias cruzadas do sacro império romano germânico, velho e usurpado primeiro primeiro Reich, porque a vossa força não impedirá o eclodir do suão.

Ana



Prémio Dardos 2012....




RARA AVIS foi contemplado pelo Prémio Dardos 2012, pelo amigo:
 muito obrigado pela partilha.


O Prémio Dardos, prestigiado no mundo dos blogues reconhece o mérito diário a cada blogger que com amor e dedicação faz espalhar o seu conhecimento e criatividade, tornando-o disponível para todos na Web.

As regras para participação são as seguintes:
1. Exibir a imagem do selo no blogue

2. Expor o link do blogue de quem recebeu o prémio

3. Escolher outros blogues para receber o Selo Dardos

4. Avisar os escolhidos

Por motivos de não descriminar nenhum dos amigos dos blogs seguidores, que
com as suas visitas e comentários têm contribuído para a motivação e criatividade do meu modesto espaço  terei que quebrar a 3.ª regra, ou seja, não escolher apenas 15 blogues, mas partilhar o referido prémio com todos os meus amigos seguidores. O Prémio também é vosso....


segunda-feira, 5 de novembro de 2012

Ah, abram-me outra realidade!

Aquiles Rondan, pintor peruano



(Álvaro de Campos)

Ah, abram-me outra realidade!
Quero ter, como Blake, a contiguidade dos anjos
E ter visões por almoço.
Quero encontrar as fadas na rua!
Quero desimaginar-me deste mundo feito com garras,
Desta civilização feita com pregos.
Quero viver como uma bandeira à brisa,
Símbolo de qualquer coisa no alto de uma coisa qualquer!
Depois encerrem-me onde queiram.
Meu coração verdadeiro continuará velando
Pano brasonado a esfinges,
No alto do mastro das visões
Aos quatro ventos do Mistério.
O Norte — o que todos querem
O Sul — o que todos desejam
O Este — de onde tudo vem
O Oeste — aonde tudo finda
— Os quatro ventos do místico ar da civilização
— Os quatro modos de não ter razão, e de entender o mundo
4-4-1929
Álvaro de Campos - Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993. 
 - 99.

Ler mais em:


Persi Narvaez, pintor peruano