Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

domingo, 20 de dezembro de 2020

BOAS FESTAS

 

Mar da Galileia/Kineret



Na margem de uma guerra qualquer, olhando os incautos passantes, desejo-te a Paz. No dia que finda, recordo que, para lá do horizonte, muitos não se erguerão no dia que recomeçará. As aparências não me fascinam, a profundidade atemoriza-me e deslumbra-me. São doces estas águas que olhas vagamente. São doces e, todavia, por elas se fez (fará) a guerra. 
Atrás, os destroços, não pouparam nem os mortos...e falas-me de um Deus menino, poderá ser? Ele pisou estes lugares, dirás. Por Esse farás as Festas e celebrarás o fim de um ano incomum a que convencionámos chamar tempo comum. Aqui, outro calendário me diz de outro tempo e o agora é já além de meados o quinto milénio. 
Assim caminhamos, reféns das disputas, tantas,  que até as divindades as tecem!



 
Desejo-te a Paz e a Saúde! E que tombem os que neste mundo cavalgam sobre a força da ignorância.

Sejamos fraternos e puros ...voltarei!

BOAS FESTAS MEUS AMIGOS!





terça-feira, 1 de dezembro de 2020

Portugalidade

 

Rob Gonsalves, «Retrato da Comunidade»


Nota breve no tempo que me foge: morreu Eduardo Lourenço, o pensador onde enformei muito do que penso, no mesmo dia de Dezembro em que morrera a minha querida avó Ana, construtora inicial da mulher que sou. Estranha coincidência. Feliz coincidência. Duas longas vidas, plenas e rectas. 


« Era convicção funda(e, sem dúvida, fundada)da maioria dos intelectuais portugueses, a de supor que uma certa cultura e, sobretudo, a respiração normal dela, era um manjar celeste para a nossa pobre mesa de eternos provincianos.» 

                                  Eduardo Lourenço, Labirinto da Saudade, pág. 175

 

domingo, 15 de novembro de 2020

Joana Lapa

 

                                                                    Maria João Fernandes


Às vezes passeio pela memória, escorrego no tempo interior, e tenho reencontros felizes. Olho, vagamente um quadro dependurado na minha frente. Está ali há tempos. A sua autora já habitou os meus dias como o quadro se instalou na minha parede ainda há mais tempo. Ah, o Tempo que não devora tudo! Desiludam-se os Antigos...eu prefiro Sophia de Mello Breyner, 


Não se perdeu nenhuma coisa em mim.

Continuam as noites e os poentes

Que escorreram na casa e no jardim,

Continuam as vozes diferentes

Que intactas no meu ser estão suspensas.

Trago o terror e trago a claridade,

E através de todas as presenças

Caminho para a única unidade.


Maria João Fernandes foi minha professora de Literatura e eu, qual Saramago a ler Ricardo Reis (que ousadia), pensei durante algum tempo que Joana Lapa seria outra pessoa. Afinal, a minha mestra, mulher de muitos talentos - professora, crítica de arte, ensaísta, curadora, poetisa, humana de olhar claro e doce - escreve poemas por detrás de um pseudónimo. O mesmo que ali está na serigrafia de homenagem a Almada Negreiros: Joana Lapa. Conheci-a tão jovem. Acreditou tanto em mim. Ah, não sei se a não defraudei...

Aqui vos deixo um dos seus poemas: (daqui)

                                                                                       

 No litoral submerso do meu ser

a pena de uma gaivota

amante do verão

escreve os gestos da espuma.

 

O pássaro a que pertence

atravessou o sol,

as fronteiras do dia

para acordar no lilás das sombras

a ressurreição do mundo.

                         Cadernos do Vento



                                                                           «La poesía nos viste de resurrección»

                                                                                          Alfredo Pérez Alencart

sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Intimamente

 

G. Ribeiro Teles


Olho pela vidraça. Há flores e folhagem verde, como se a Natureza se distendesse após os calores tórridos deste Verão que aturdiu e cegou os pássaros cansados. O cansaço da corrida diária pode arredar a adrelina dos dias. Silêncios. Pássaros tardios. Silêncios.
Tu não sabes e não podes adivinhar. Cada dia é um limite. Cada dia dia o limite se alonga como um horizonte na planície. Cada acção se paga, cada deslize se reflecte no narcísico lago. A prosa dos dias.
Trabalhamos em universos infinitos: virtuais, parciais e reais... mas já perdemos a noção do Real. Ricardo Reis vai ajudando a aceitar o destino. O seu ritmo cadencia a minha voz...Os sábios de Alexandria ficaram próximos, descemos até à Pérsia. Percebeste que o planeta ficou minúsculo, eu percebi que os dias se tornaram muito pequenos e que, neles, não cabe a minha vida toda. 
Quero que cumpras a tua vida e que não cedas à desesperança. Sorrio como posso e, intimamente, desejo que o meu olhar ainda te conceda algum brilho. Às vezes penso que talvez se tenha apagado a velha luz, que os anos desbotem a empatia e que tudo se tenha tornado asséptico.


                                                                         in, Jornal d Madeira

domingo, 27 de setembro de 2020

Sugestão de leitura

 

                                                                   Temas &Debates


Vivemos tempos complexos. O meu, em particular, vai-se escoando a uma velocidade estonteante. Gosto da lentidão, já se sabe, do resfolegar morno e materno da planície...mas a vida insiste em contrariar-me. Só um vício continuo a alimentar: ler, ler e ler. Assim, por vezes, me tenho que retirar, nesse silêncio e distância. 

Leitora de muitos ensaios, aqui vos deixo uma sugestão bem adequada aos tempos arenosos que pisamos. «Tudo é  Economia», dizem-nos! Frase tão falsa, como perigosa. Sofisticada forma de nazismo, criadora de ilusões de «perfeição» e de «apuramento» de uma forma de ser e de estar. 

Vender a felicidade, sob toda a forma de disfarces parece ser o último dos embustes.



SINOPSE

A indústria da felicidade, que movimenta milhões de euros, garante transformar os indivíduos em pessoas capazes de dominarem os seus sentimentos negativos, e de tirarem o melhor partido de si próprias por meio do controlo completo dos desejos improdutivos e dos pensamentos derrotistas.

Porém, não estaremos perante um novo ardil que visa convencer-nos, uma vez mais, de que a riqueza e a pobreza, o êxito e o falhanço, a saúde e a doença são única e exclusivamente da nossa responsabilidade? E se o propósito da chamada «ciência da felicidade» for a criação de um modelo social individualista que renega qualquer ideia de comunidade?


quarta-feira, 26 de agosto de 2020

Ainda Somos um Segredo

https://www.fogecomigo.pt/product/guia-alto-alentejo-ainda-somos-um-segredo

O título sugestivo acompanhou-nos neste Verão. Julho trouxe-me a vista esquerda, Agosto refez-me a vista direita e a pandemia aprisionou-me no meu Alentejo. Assim, desvendámos alguns recantos secretos e pouco visitados do megalitismo alentejano e perdemo-nos pela charneca tisnada pelo Sol escaldante. 
Há muito que tinha este guia turístico, mas estava convencida de conhecer bem o meu território, como aqueles alunos que não lendo as obras se orientam com resumos...e havia uma outra razão mais íntima. Sempre que o abria não encontrava uma referência fundamentada ao passado judaico desta terra sefardita. Mas o resto lá está! Mesmo as remotas pinturas rupestres a céu aberto. Sim, existem pinturas rupestres, por aqui! Uma visita na Primavera pode ser um deslumbramento de cores e tonalidades. Fica o convite.

Lapa dos Gaivões

Ainda Somos um Segredo fez-me recordar aquele dia, já distante, em que perante o anfiteatro um de uma destacada universidade, repleto de académicos, a arguente me disse do alto da sua distinção: «Tudo muito bem, mas não existiram criptojudeus.» E, eu, que tudo vi acontecer na casa da minha avó materna e vivi a realidade ali negada, calei-me. Percebi, naquele instante, que o antissemitismo existe e é transversal. Percebi que existem máculas de bastardia social em todas os estratos. Que sabem os doutores da vida? Que sabe a vida dos feudos dos doutores? Que aprendi, eu? Fácil: tudo muito bem, assim se falha o cum laude. Não me interessam as supremas honras dos discriminadores.

Anna Hatherly olhou-me com aqueles seus olhos de água e eu sorri. Cá fora disse-me: «Eu avisei-a, se tivesse vindo o Aguiar e Silva isto não aconteceria. Teve grande coragem em não retirar o termo e ignorar o reparo». 
- Professora, eu não mentiria.

Retirei do pescoço o pequeno triângulo de ouro e entreguei-lho. Disse-me a Dalila - ao estudar a poetisa -  que, o tal pendente, ainda faz parte do seu espólio.





Na sensual tranquilidade da palavra
o poeta tenta uma arriscada ordem
e entre a fábula e a reportagem

simula mentir
para atingir
a superior verdade

Ana Hatherly, in A Idade da Escrita

domingo, 9 de agosto de 2020

Do Líbano

Arte fenícia ou dos cananeus - libanesa
Helen Zughaib, pintora libanesa


DEIXO-LHE MEU CORAÇÃO

O que tu perguntas
por ódio, meu irmão?
Já te deixei, em cima dos meus lábios ardentes,
entranhas destruídas no lago
e na praia, latejando, pedaços de minha pele.
Eu morro no limiar da tua pátria.
A espada das tuas gerações
descansa no meu pescoço
e o chicote dos teus ancestrais açoita-me.
Eu morro sob teus pés
para saber as tuas línguas,
para misturar o gelo de inverno
e brotar na primavera
fiz um casulo com tuas flores.
As folhas das árvores murcham,
mas suas sementes são
o eco inextinguível da terra.
O coração me invade
enquanto tu contemplas,
agora que eu lentamente desligo e
os seus corpos crescem diante dos meus olhos.

Said Akl (poeta libanês, m. 2014 em Beirute aos 102 anos)


P.S. Estou de volta e correu bem, outra vez. 


Obrigada pelo apoio e paciência.

sexta-feira, 24 de julho de 2020

Já deveria ter dito




Poderia falar das ausências, do excesso da Luz, das infinitas páginas lidas, do trabalho excessivo...mas, essa é a riqueza da vida, na busca infindável que o Tempo nos concede.

Fica apenas a verdade: o cristalino teve que ser substituído e isso me tem afastado destes lugares.

Vou regressando...

Bom fim-de-semana, meus amigos!



sexta-feira, 17 de julho de 2020

Com o Sol a prumo


Alentejo, Rádio Campanário




Com o Sol a cair-nos sobre a cabeça, cá vamos vivendo. Temos a consciência dos dias árduos, das súbitas madrugadas que rasgam as janelas abertas com um fresco ar de noroeste e deste silêncio que se abate sobre os corpos lassos.
Este é o lugar que amamos. Nele, os extremos moldaram a natureza dos homens e relativizaram a acidez de cada momento. Nele, forjámos o carácter de que nos acusam, mas que nos identifica e nos torna capazes de não desistirmos nunca. Nele, a eterna juventude que uma sociedade de plástico vendeu, nunca vingou - nós amamos os velhos! Eles são a sageza e a memória dos tempos - ainda os ouço na soleira da porta da minha infância, quando esperávamos a frescura das noites longas de outros tempos tórridos!
Somos assim, orgulhosos de o ser, numa raiz velha de tantas misturas de povos que por aqui passaram - bastardia que não tolera a injustiça, ainda que disfarçada de alguma veste solene.
Agora, aqui estamos, ao dispor do que virá. Chama-lhe destino, divindade, ou pandemia, ou crise. Agora, aqui estamos e lutaremos! 



Ana


domingo, 31 de maio de 2020

Trovoadas

Foto: Radio Campanário - maio 2020

Na inconstância dos dias, a beleza agreste da planície desperta-nos como o murmúrio de uma nascente adormecida. Aulas a fio, feitas à distância, por processos inimagináveis e aqueles outros jovens assustados que sorriem vagamente, na lonjura de três metros. São dez de cada vez, em turnos sucessivos. O auditório imenso, o palco, a sombra e aquela voz, que é a minha, soando estranha por detrás da máscara. Onde estão os sorrisos? Quem são estes meninos que não conheço, perfilados e quietos? Que lhes reservará o Futuro? Lemos Saramago que, suspeito, eles não leram. A frieza dos rostos inexpressivos drapeados a azul clínico, neste dia de quarenta graus.
Trovoadas diárias despertam os meus medos ancestrais. Sou o felino que se esgueira no mato verde da charneca.Tenho medo e quero ver. Gosto de olhar o pavor de frente. Assim, ele se esfuma e que «Os raios não nos partam!». Quero a liberdade plana do meu chão.

Ana

sexta-feira, 29 de maio de 2020

As Não-Notícias...

Gonçalo Ribeiro Telles não morreu

Ao contrário do que foi escrito pelo Observador, Gonçalo Ribeiro Telles não morreu. O equívoco surgiu de um contacto com um amigo próximo do arquitecto. As nossas desculpas ao próprio e à família.(Observador).


Encontrado corpo de jovem 
que morreu
 afogado a tentar homem no Alvor
(Jornal i)


Os concelhos mais afetados encontram-se nos subúrbios da cidade de Lisboa. Há um conjunto de focos dispersos pela a região que fazem subir o número global de contágios. (Observador)



Médio Oriente - José Alves - 2019


O meu tempo foge, como alguns @migos sabem de há muito. Quando O Sul Sereno se cala o meu quotidiano agita-se, num movimento pendular e sem pausas, entre o trabalho e a família - especialmente a sénior.
Dias que de súbito se esgotam.
Resta-me um evasivo minuto para me surpreender com as não-notícias e a total destruição do jornalismo.

Bom fim-de-semana, meus amigos.


domingo, 3 de maio de 2020

O meu lugar

Senhora dos Prazeres, foto da Câmara Municipal de Ponte de Sor


Lugar de alguns sonhos corridos por esses caminhos. Lugar de noites feitas de fiapos de relento e de astros familiares identificados no breu. Lugar de bateria recarregada, porque a alma ancestral ali se lava do quotidiano. O romance, as pedaladas vigorosas na familiar bicicleta. A corrida dos velhos tempos de atleta. A caminhada longa. A chegada motorizada.
Ancestral «Senhora dos Prazeres» que tanto te amamos. Tu, a velha fenícia da inscrição que ainda guardas. Tu, a romana convertida aos prazeres sórdidos do caminhante em velha estalagem que aliviava a estrada até Mérida. Tu, a templária de secretos segredos que ainda hoje guardas nos teus cultos primaveris. Velha sefardita, aliada a Castelo de Vide, dos imensos piqueniques campestres. És nossa em Maio e dos de Castelo de Vide em Setembro. «Senhora dos Prazeres», com esse topónimo, alguma vez foste católica?
Madrinha de meninas que nasceram como eu, filhas de um tempo antigo. Padrinhos? Dois. Madrinha? Tu! Hoje, anos levados, ainda te amo na tua singela complexidade, na ausência de tantos a quem quisemos juntas.
Vejo-te como o Açor que sobrevoa a nossa terra e lhe roubou o nome. A criança que me habita, corre pelos caminhos desarvorada, feita trigo do Futuro.

Ana


domingo, 12 de abril de 2020

Querida Sefarad


Ascent of The Spirit, Vladimir Kush


A terra da minha infância leva-me a essa pura ascensão do espírito. Estes caminhos da memória são feitos de muitos passos e de alguma fuga ao pensamento estabelecido. Trazem-me o som rangente da bicicleta sobre a areia solta.


Falcão, 2020


Este é o cheiro das estevas quentes pelos primeiros raios do sol primaveril. Viagem de retorno eterno. Vida a desabrochar, mesmo se daqui quase todos partiram. Esta é a passagem.


Aldraba, 2020


A mão, a vida física, a protecção da velha casa da avó. Mas, esta,  era só uma casa de passagem. Logo à entrada, num recanto, estava a verdadeira chave da casa que não abria esta porta. 



Crescente ou fermento, 2020, cá de casa


Façamos só mais alguns pães. Contigo, avó, aprendo o fermento. É um exercício de espera e de paciência. Com a mãe o continuo. Hoje, estou sozinha a alimentá-lo. Este cheiro genuíno, este travo ácido...vem de um lugar remoto na minha infância.



Pão alentejano, 2020, cá de casa

Duvidas, ainda? A cultura materna não se escreve nos livros. Ela é a vida, este valor intransmissível que respeitamos em cada tonalidade e que aprendemos vivendo. Não a aprendi em nenhuma das universidades por onde andei.


Bolo de bacia tradicional, 2020, cá de casa

O cheiro quente da canela e da erva-doce há-de renovar cada sentido, como um hino ou como um salmo. A tradição não significa conservar, mimetizar, teatralizar...a renovação é o significado íntimo de cada gesto. Quantas vezes te falei da sobrevivência?


Pão sem fermento, 2020, cá de casa

Hoje deitamos fora a massa velha e renovamos o antigo ritual. No nosso querido Alentejo, o cabrito há-de estar sobre a mesa e, humanos seremos...comendo!


Cabrito de leite,2020, cá de casa

Não me peças, hoje, Poesia!
Ao longe, no mais rico dos países, a desumanidade grassa e o pavor instala-se. Nós conhecemos a perseguição, o caminho da sombra, mas somos humanos e sofremos. A nossa rota invisível, como o inimigo que nos persegue, não logrará vencer a nossa Humanidade!


Nova Iorque, valas comuns, 2020
Ana


Nota: itens alimentares cá de casa!


terça-feira, 7 de abril de 2020

A Estranha Ordem das Coisas

Atrás das barras_P & Ink, Vladimir Kush

Com os meus alunos do outro lado de um ecrã, alojados numa turma virtual e entregues a uma aula digital, escondidos de um inimigo invisível, procuro a expressão mais exacta de cada momento. Não é uma tarefa fácil, nem para mim que vivo do uso desta nossa Língua comum.
A primeira semana foi a de uma ausência. Onde está o parque que atravessaria a cada manhã, enchendo o peito dos primeiros raios de luz para levar até vós? Onde, aquele frenesim de vida a desabrochar em cada olhar fugidio ou acolhedor como o futuro que prepararíamos juntos? Onde, o meu chegar silencioso e súbito que te surpreenderia num susto pueril? Onde a empatia e o sorriso, ou o ar severo que para ti ensaio?
E o tempo vai criando a rotina de uma (novi)profissão que preencheu os dias inteiros numa distopia, verdadeira antiutopia de tudo o que fui. 
E, neste negativo da velha fotografia daquilo que fomos, restou-me escolher mais um livro para ler. Aqui partilho convosco A Estranha Ordem das Coisas, de António Damásio

A Estranha Ordem das Coisas - Livro - WOOK


«Os seres humanos acabam sempre por depender da maquinaria dos afectos e das suas ligações com a razão. Não há maneira de fugir a tal condição.» pág. 305, 1.ª edição, 2017 


Saúde, meus amigos!


sábado, 21 de março de 2020

POESIA IMORTAL

«Safo admirando Alceu», Lawrence Alma-Tadema
«Dizem que há nove musas, que falta de memória! Esqueceram a décima, Safo de Lesbos» (Platão)


..........Só hoje sei o que é ser deus… Quem é esse homem que está sentado na tua frente enquanto tu falas descuidada e ris de maneira encantadora? 
..........O meu coração bate-me descontroladamente no peito e eu pergunto-me, tentando sondar este mistério: 
...........Que se passa comigo, se, de repente, me vejo a habitar um mundo deserto, se os meus ouvidos parecem feitos de zumbidos e os meus olhos já não servem para ver, se a própria boca indomável das palavras emudeceu? 
...........Como entender este tremor louco sem febre, este gelo que me inteiriça os membros a par deste fogo que pega na caruma interior das minhas veias, este ficar mais verde do que a erva, esta proximidade constante de morrer? 
..............Dizem que tudo se deve suportar. Mas para quê?
                                                                            
                                                               (fragmento 2 D)

Adaptação de Manuel Pulquério, Univ. Católica




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Google



Safo terá vivido no século VII AC e é a Poetisa. A poesia clássica ainda é inigualável. 
Como ousaria, eu, corromper este Dia com a banalidade ou a imitação da lírica pós-moderna?




BEM HAJAM! 









quarta-feira, 11 de março de 2020

Pandemia...

 María de los Remedios Alicia Rodriga Varo y Uranga
N. 1908, Anglès (Gerona), España
M.1963, Ciudad de México, México

Gostaria de um discurso íntimo e feliz. 

Remedios Varo

Gostaria de falar-vos destas pintoras invulgares. Mulheres inquietas e visionárias. Mulheres, heroínas da normalidade dos dias atormentados.


 Leonora Carrington
N. 1917, Lancashire, Inglaterra
M. 2011,Ciudad de México, México

Gostaria de recordar que as duas viveram duas guerras que assolaram o mundo. 


 Leonora Carrington
E nos seus olhares o caos se tornou uma mágica desordem. A beleza pode ser assim: conjuga uma harmonia entre o diurno e o nocturno.

Tenhamos a serenidade dos que contemplam, mas a acção dos fazedores de um mundo novo, no qual o medo seja apenas usado de forma luminosa para nos levar a agir contra aqueles que, na sombra, o usam para do caos reerguer nova ordem!


A cidade inteira, 1936 por Max Ernst (1891-1976, Germany) |  | ArtsDot.com
«A cidade inteira», Max Ernst


Gostaria de dizer-vos que não seremos despersonalizados e não afirmaremos, como Max Ernst, depois da guerra. De nós não falaremos na terceira pessoa:

“Max Ernst morreu em 1.º de Agosto de 1914. Ressuscitou em 11 de Novembro de 1918, na forma de um rapaz que queria ser mágico e pretendia descobrir os mitos de seu tempo”. (Wiki)


sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Para ti






Vladimir Kush


Da minha mão, nasceu o poema
eterno como a luz, rápido como o vento.
No sossego da palavra, crio o alento
da verdade pura, que tornei em lema.

No céu distante, mais além de Deus,
uma alma pura de paz se incendeia
na escuridão dos passos, fio de candeia,
abraço a tua alma e os carinhos teus.

E na rocha imensa, com orvalho puro,
teu nome de amor, tão terno e tão duro,
vai aquecer no mundo, a minha alma triste

porque no Amor, só Amor criado
esquecerá no templo, junto ao ser amado,
a voz da Razão, o Destino em riste!


José M. T. Alves 


O blogue, hoje, abre-vos uma excepção. Apresenta-vos o meu marido/alma gémea de décadas. Mas...não foi a primeira vez que aqui o trouxe!

https://raraavisinterris.blogspot.com/2009/08/nao-te-quero-senao-porque-te-quero.html




segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

Rumo

Alto Alentejo, 2020


A minha vida faz-se olhando a planície. As cores que se transmudam ao sabor dos dias pautam-me uma melodia íntima que não vos saberei transmitir. É uma cantata de comunhão e harmonia, de serenidade e de sonoridades que orquestram cada momento.
Vou a trabalho, pois aqueles que longe legislam não se perdem na distância e desconhecem a luminosidade que escorre da lonjura.



Alto Alentejo, 2020

As nuvens viajantes são minhas companheiras e nelas arrumei a infância. Mas reconheço o cheiro da erva cortada e esta humidade que a terra respira. Nunca estarei só, nestas paragens. Tudo se reduz na sua mesquinhez citadina, quando se espraia o olhar pelo longe do horizonte.


Alto Alentejo, 2020

A Primavera que espreita não me retira a inquietação. Eu sei o perigo que se disfarça em cada ondulado do caminho. É estreita a via. Há rumores de que novas guilhotinas se aprestam e de que rondam as sombras esquivas de novos senhoritos e inquisidores.



Alto Alentejo, 2020

Um velho leva as suas cabras. Atravessa a rua deserta. Traz-me o tempo antigo e as portas fechadas. Vou a trabalho, já to disse. Não sou a «cabrita» livre que saltitava pela aldeia da minha infância rodeada de amigas «cabritas» como eu. As avós e mães já não gritam por nós e este não é o tempo das amoras que colhíamos no largo. Agora, só o horizonte é largo e a sua vastidão grita-me a força vital que não nos abandonou, ainda...
O céu não nos cairá sobre a cabeça.


Alto Alentejo, 2020

quarta-feira, 29 de janeiro de 2020

Teorias da conspiração ou sinais dos tempos?

Teorias da conspiração




«Umbrella Corporation (também conhecida como Umbrella, Inc., Umbrella Pharmaceutical Inc. ou Umbrella Corp.) (アンブレラ・コーポレーション) é uma empresa fictícia para série de jogos e filmes Resident Evil, fundada com o objetivo de criar armas biológicas. Ela opera sob uma espécie de monopólio no mercado mundial. A Umbrella produz produtos farmacêuticos, armamentos, computadores e outras atividades clandestinas de pesquisa biológica.

O Slogan seria "Our Business is Life Itself" ou em português "Nosso negócio é a própria vida.", outro slogan diz: Umbrella's moto have always been: "Preserving the Health of the People", ou em português: O lema da Umbrella sempre foi: "Preservando a saúde das pessoas", um terceiro slogan foi introduzido no Brasil através dá série de longa metragens de Resident Evil onde diz "Nosso negocio é a vida, fazemos tudo por você".

A Umbrella foi fundada por James Marcus, junto com o Lorde Ozwell E. Spencer, um descendente da família real inglesa, e Edward Ashford.

Na franquia de filmes a Umbrella é a principal vilã sendo comandada por Albert Wesker que perdeu o controle da empresa para a IA Rainha Vermelha que retorna em Resident Evil Retribuition.

A empresa havia saído da série de jogos, quando no começo de Resident Evil 4 o protagonista Leon narra que a empresa tinha falido, outros jogos da franquia também confirmam o acontecimento, como Resident Evil Umbrella Chronicles e Resident Evil Outbreak File #2. Em Resident Evil 6, surge uma empresa chamada Neo-Umbrella, a mesma possui Carla Radames como líder. A empresa é fortemente inspirada na Umbrella Corporation, aparecendo já formada com bases subaquáticas e grandes laboratórios.» (WIKIPEDIA)




Estranhos são os tempos, mas os sinais e símbolos instalam-se por toda a parte. São fruto dos mitos e da tentativa de os explicar. Pessoa diria, «O nada que é tudo». Daí que os símbolos me atraiam tanto.

Vivemos num tempo de realidades fraccionadas, mesmo que o conceito de Real sempre tenha sido a inquietação filosófica por excelência. As preocupações são, por isso, crescentes. Entranham-se os símbolos, modifica-se a realidade aparente, mas é nela que habitamos.

O tempo do «eu» é de uma perigosidade enorme: eu posso; eu mereço; eu quero; eu vou; eu tenho...o individualismo pós-moderno, pós-ocidental, pós-humanista exportado através de todo o tipo de indústrias que alimentam o grosso ventre das sociedades consumistas - à margem de ideologias que se esfumam.

O «eu» observa-se a si próprio, esquecendo-se da sua natureza de animal social, tal como o definiu Aristóteles. Os resultados estão à vista!




Nota: lá vou eu ter que apagar mais um comentário do movimento, dito, pós-humanista. Estes comentários são frequentes por aqui, bem como os convites. Calma, a minha geração leu Nietzche na adolescência e sabe muito bem que não somos todos hiperbóreos.