|
Alto Alentejo, 2020 |
A minha vida faz-se olhando a planície. As cores que se transmudam ao sabor dos dias pautam-me uma melodia íntima que não vos saberei transmitir. É uma cantata de comunhão e harmonia, de serenidade e de sonoridades que orquestram cada momento.
Vou a trabalho, pois aqueles que longe legislam não se perdem na distância e desconhecem a luminosidade que escorre da lonjura.
|
Alto Alentejo, 2020 |
As nuvens viajantes são minhas companheiras e nelas arrumei a infância. Mas reconheço o cheiro da erva cortada e esta humidade que a terra respira. Nunca estarei só, nestas paragens. Tudo se reduz na sua mesquinhez citadina, quando se espraia o olhar pelo longe do horizonte.
|
Alto Alentejo, 2020 |
A Primavera que espreita não me retira a inquietação. Eu sei o perigo que se disfarça em cada ondulado do caminho. É estreita a via. Há rumores de que novas guilhotinas se aprestam e de que rondam as sombras esquivas de novos senhoritos e inquisidores.
|
Alto Alentejo, 2020 |
Um velho leva as suas cabras. Atravessa a rua deserta. Traz-me o tempo antigo e as portas fechadas. Vou a trabalho, já to disse. Não sou a «cabrita» livre que saltitava pela aldeia da minha infância rodeada de amigas «cabritas» como eu. As avós e mães já não gritam por nós e este não é o tempo das amoras que colhíamos no largo. Agora, só o horizonte é largo e a sua vastidão grita-me a força vital que não nos abandonou, ainda...
O céu não nos cairá sobre a cabeça.
|
Alto Alentejo, 2020 |