Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

sábado, 26 de fevereiro de 2011

Eco III - Exortação

Rafal Olbinski


Lembrei-me hoje de um poema de Miguel Torga.
As notícias do mundo correm velozes e cheias de bravatas, numa espécie de erosão do humanismo que há em nós. Imagens de beleza e exotismo converteram-se em rios de revolta e, de palácios intransponíveis, velhos ditadores ameaçam ainda.
Jovens sem rumo vagueiam nas ruas de ricas cidades ocidentais que parecem caminhar para um qualquer ocaso civilizacional.
Lembrei-me hoje de um documentário da BBC.
Regiões do mundo despertam da letargia de milénios e o planeta, em fúrias súbitas, sacode as cidades do homem. Escombros, vistos do conforto luminoso das nossas salas, tomam a irrealidade de uma ficção distante.
Erguem-se da penumbra os profetas sombrios e falam-nos de um calendário esquecido. Profetizam o fim dos tempos e, quiçá 2012 cumpra o seu termo...
Lembrei-me do que somos: pequenos seres no imensurável Universo, capazes, poderosos no nosso humanismo impoluto!
Assim, aqui vos deixo a «Exortação» e o «Hino ao Homem».

Ana

*****

Em nome do teu nome,
Que é viril,
E leal,
E limpo, na concisa brevidade
— Homem, lembra-te bem!
Sê viril,
E leal,
E limpo, na concisa condição.
Traz à compreensão
Todos os sentimentos recalcados
De que te sentes dono envergonhado;
Leva, dourado,
O sol da consciência
As íntimas funduras do teu ser,
Onde moram
Esses monstros que temes enfrentar.
Os leões da caverna só devoram
Quem os ouve rugir e se recusa a entrar.


Miguel Torga

Hino ao Homem

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Homo sum: humani nihil a me alienum puto

google
[Arabic]
(Sou Homem: nada do que é humano me pode ser alheio, Terêncio)

 

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiPOjKjdM1J-f2M-Z9lLQo_SOmqABQ8i63fO_yB4zo6ViuCz3Iy0JxUOwMsMNx0j_Ih8nJ0u8HvIw6py6SeDD2xfsnKAq13TJKQdqZtdhjBIx3r79xNj7N042-hy2wHsutzB6KSnIjs06MS/s400/11049453.jpeg
 Líbia

 Ibrahim al-Koni, o maior romancista da Líbia, no seu livro A Pedra Que Sangra,  cita esta canção sufi que, hoje, aqui deixo:


O deserto é um verdadeiro tesouro
para quem busca refúgio
dos homens, da maldade dos homens.
Nele há contentamento,
nele há morte e tudo que procuras.


       

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Poemazinho eterno

Aldano Langa





Os amigos
eram falsos como Judas.
Ah, como Judas, não.
Judas arrependeu-se.

Os amigos
eram mesquinhos como Judas.
Ah, mesquinhos como Judas também não.
Judas vendeu Cristo
e enforcou-se.

 José Craveirinha



http://www.fflch.usp.br/dlcv/posgraduacao/ecl/pdf/via05/via05_08.pdf

domingo, 6 de fevereiro de 2011

Geografias



Julho - 1969, ilustração de Manuel Ribeiro de Pavia


Veio o sol e, serenamente, partimos.
Aquecidos e reconfortados mergulhámos no Alentejo verde. A paleta vai-se tingido aqui e acolá de mantos brancos e amarelos. Na terra dura e não lavrada, manchas de ervas vermelhas e rasas simulam campos tingidos pelo sangue secular de batalhas idas, nos milénios, nos séculos...
Vamos em círculo.
Mora...Brotas...Ciborro...Montemor-o Novo...Arraiolos....Vimieiro...Pavia....Avis...
O neo-realismo de Namora já não junta o Trigo e o Joio. 


http://www.leiloes.net/upload_tmp/2/img_95852572_1282505672_abig.jpg
google

Os castelos e os menires, circulares, recortam a paisagem iluminada.


http://www.cm-arraiolos.pt/NR/rdonlyres/A5467878-C049-4114-AFAB-426E0CC9CE11/23254/Imagem035.jpg
CM de Arraiolos

Velhos ao sol, gatos estendidos, rectas intermináveis...e, todavia, desenhamos um círculo no macadame-espelho que se reflecte em miragem. Cruzamos a História. Só sinais rugosos na paisagem nos dizem o que foi dito. Debalde se desbotaram as verdades e se atenuaram os mistérios. 
Em Pavia as recordações gritam, ainda, sincretismos mal esfumados. 



http://agenda.pt/UserFiles/anta_de_pavia.jpg
CM de Mora

O rio Tera corre sereno e já não inspira a Paciência Constante*, de Manuel Quintano de Vasconcelos, na sua viagem até ao Raia, que depois se faz Sorraia, quando abraça o Sor, e juntos mergulham no Tejo até Lisboa numa viagem pastoril que se fez urbana, num século talvez dezassete e desaguou no Rossio em noites negras de Autos de Fé.

 Ana

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

África, 4 de Fevereiro

Tyukanov (se ampliar o quadro,verá a pequenez do ser humano)




«O avô Bento, em noites de cacimbo à volta da fogueira, nos contou, fumando o seu cachimbo que ele próprio esculpiu em pau especial. Dizia a estória se passou aqui mesmo, nas serras ao lado, mas pode ser que fosse trazida de qualquer parte de África. Até mesmo do Oriente, onde dizem também há água lilás. Se virmos bem, em muitos lados pode ter uma montanha semelhante. Eu só escrevi aquilo que o avô nos contou, não inventei nada.», pág.11


« Ninguém faz mal aos amigos em desgraça. Ficou combinado que ninguém ia invadir a montanha. Com água lilás ou sem água lilás.

 [...]

 « O lupi-poeta fez então muitos poemas. Contavam a estória dos lupis e da água lilás. Também da desgraça que se abateu sobre eles e o seu destino.» p.p. 161-162

A RELER:

PEPETELA, A Montanha da Água Lilás - Fábula para todas as Idades, D. Quixote, Lisboa, 2002