Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

sábado, 2 de agosto de 2014

Fármacos...

Salvador Dalí

«Havia também a prática do bode expiatório, o fármacos, remédio para as grande desgraças que ferem subitamente as cidades. Era em Atenas e nos grandes portos comerciais da Jónia, nos séculos VI e V, nessa primavera da civilização que hoje nos parece tão clara, tão fértil de promessas já cumpridas. [..]Contudo, pelo sim pelo não, estas cidades tão modernas sustentavam um certo número de rebotalhos humanos, inválidos ou idiotas, ou reservavam condenados à morte, que em caso de fome ou de peste eram sacrificados aos deuses por lapidação. Ou então expulsava-se da cidade o bode expiatório, intocável a partir daí, pondo-lhe nas mãos figos secos, um pão de cevada e queijo. Ou ainda, depois de o terem fustigado sete vezes com hastes de cila selvagem nos órgãos genitais, queimavam-no e lançavam-lhe as cinzas ao mar. O uso do fármacos passou da Jónia para Marselha.» (Bonnard, pág.8)

File:The Scapegoat.jpg
William Holman Hunt.
Muitas vezes volto a este volume de André Bonnard, pois a belíssima tradução de José Saramago acrescenta beleza literária à informação original. Está envelhecido o meu volume, como estafada está a civilização grega. Porém, a antiga prática do «bode expiatório» alastrou como verdade universal, numa impressionante caracterização de algumas estruturas antropológicas do imaginário humano. As sociedades impregnaram-se dessa especular tradição. Na realidade, também os gregos a assimilaram de outras tradições. O caso aqui pouco importará, pois a actualidade está repleta de «fármacos», termo do grego antigo que designava essa prática. Hoje, poderíamos chamar-lhe outros nomes - da religião à mera propaganda ou ao injusto sacrifício dos inocentes.





11 comentários:

Edum@nes disse...

Há muitos fármacos!
mas não curam a doença
neste país sem patacos
futuro sem esperança!

Não há meio do povo acordar!
sem vergonha no focinho tanta
nos ordenados e pensões irão cortar
para mais milhões darem à banca!

Bom fim de semana para você amiga Ana, um beijo.
Eduardo.

São disse...

Aninhas, fármacos vendem-se alucinantemente em Portugal, mas o remédio passa por extirpar o Mal ..e esse vem de cima , de muito de cima e cada vez mais contamina a nossa vida e a de inocentes sacrificados à cobiça dos Senhores do Mundo e da Guerra!

Não há bode expiatório que nos valha, desgraçadamente...

Beijos, muitos.

Manuel Veiga disse...

somos cinza ainda quente desse mar...

e refinamos nos "fármacos"... e nos males.

beijo

Daniel C.da Silva disse...

A pintura do dali está muito bem escolhida...

beijinho amigo

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

fármacos que não curam e ainda nos fazem pior...

:(

Petrus Monte Real disse...

Ana:

Obrigado
pela excelente mensagem
dedicada aos bodes expiatórios ["fármacos" para os gregos],com a qual muito aprendi!

Os sábios gregos [e de outros povos] deixaram-nos um grande legado na área do Conhecimento!

Eles perceberam bem a verdadeira natureza da raça humana
e a tendência profunda
a projectar a sua própria culpabilidade sobre outrem...
Mas noto uma diferença:
na época, o bode expiatório poderia carregar o pecado de toda uma comunidade; hoje, porém,
o bode expiatório é a comunidade
que carrega os pecados de um reduzido club de "iluminados"!

Muito grato pela partilha

Beijos

Existe Sempre Um Lugar disse...

Boa tarde,
Os fármacos são parte da solução para quem necessita, derivado ao que tem acontecido nestes últimos 3 anos no nosso país, a venda de calmantes disparam, estamos a ser contaminados pelos vírus maléficos dos nossos (des) governantes.
Dia feliz
AG

http://momentosagomes-ag.blogspot.pt/

Maria Alice Cerqueira disse...

Boa noite amiga!
sempre é muito saber sobre a nossa historia, seja boa ou não! Mas eu muito particularmente não gosto de fármacos!
uma linda noite para você!
abraço amigo!
Maria Alice

Graça Pires disse...

Também gosto de ler André Bonnard. A civilização grega tem muito interesse. Mas não há civilização, por mais avançada que seja que não encontre bodes expiatórios para o que corre mal...
Um beijo, Ana.

Luma Rosa disse...

Oi, Ana!
Sempre procuram colocar a culpa em alguém ou em qualquer coisa...
Quem não consegue se livrar da culpa ou se deixar manipular, por certo será eliminado do sistema sem dó!
Beijus,

Nilson Barcelli disse...

Também temos os nossos bodes expiatórios.
E não prendem o Ricardo Salgado...
A civilização grega é fascinante, não só pelas suas qualidades como também pelos seus defeitos.
Ana, tem um bom fim de semana.
Beijo.