Marmelos - wikimédia |
Naquele dia havia sol. Quase Verão. Percorremos a charneca tisnada, mas onde uma relva miudinha já aflorava. Velhos marmeleiros, que os avós abandonaram ao morrer, insistem ainda em frutificar e escrever em círculos temporais uma memória antiga, plena de meninice.
José sabe como esta fruta ácida da minha infância doce suaviza a minha vida. Nela retorno, nela me renovo. Solícito vai colhendo...como um menino, sorrindo, entrega-mos. Hei-de assá-los, suavemente polvilhados com açúcar amarelo, e torná-los uma suprema delícia original. Velho sabor, velho carinho de autenticidade.
romã - Wikipédia |
Levemos também algumas romãs. Estes frutos esperarão. Fitá-los tira-me da rotina.
O fim de Outubro desaba, agora, copioso. Águas sujas não limpam as palavras que nos atordoam. O país está barulhento.
Ah! Se acreditássemos que os caminhos são possíveis, num regresso ancestral a uma qualquer grandeza primitiva.
Fala-me dos ideais, fala-me dos ideais... Que bom precisarmos de tão pouco para nos reencontrarmos!
Se assim não fora...
broas de mel e noz |
Hoje começaremos, oficialmente, este Outono e eu farei broas de mel. Que faça frio, que chova, mas não me compres jornais deste país que entristece e resmunga.
Eu só quero voltar no rumo da saudade, na rota do vento sul tempestuoso e aconchegante. Outubro vai terminar. O ninho aquece, mas um sopro gélido varre o horizonte...
Pesa o trabalho excessivo. Pesa a memória. Pesa o presente...e eu só quero a recordação.
Outubro termina e eu vou levar-vos crisântemos amarelos ao sítio onde a saudade mora.
Os marmeleiros ainda resistem, rudes e bravios como nós.
Ana
crisântemos |
12 comentários:
Que saudades de marmelos cozidos com
açucar......deixemos as políticas para
os homens de maus pensamentos...e
recordemos quem nos amou...
Beijo
Minha querida Ana
Não faças isso...aquela romã, levou-me de volta à minha infância, ao meu querido Alentejo...à minha mãe que me arranjava a romã em baguinhos numa tigela.
Meu Deus...que saudade.
Deixo um beijinho carinhoso para ti.
Sonhadora
A palavra "charneca" me lembra Florbela.
Estou adorando a série.
Acaba o outono, trocam o horario para aproveitar a luz do sol, o seu calor...e pode ser que näo estemos preparados para receber o frio inverno...
E têmos mêdo desse inverno no nosso coraçäo, nas ruas, nas cidades, no mundo...
Este mundo que anda louco e que nada bäo nos presenteia.
E nos escondemos en nossas lembranças de tempos melhores.
Lembranças de crianças.
Das coisas que nos davam prazer e segurança.
Sabores, côres, cheiros, compañia, amparo de nossos velhiñhos, de nossos avôs,..
E parece que isso nos dá paz, nos dá segurança...
Quer um doce de arroz?
A vovó acaba de faze-los....
Obrigada, minha amiga.
Hum,muito bom!!!
Bom fim de semana,Ana.Beijinhos.
Ana, quero a receita da Broa de mel. Fiquei com água na boca com essa roma.
Bom fim de semana
Bjao
Uma delícia... texto e fotos.
Gostei muito.
Beijos, querida amiga.
Nao sei porque, inspirou me tanta ternura o texto :)
Beijinho
Olá Ana, muito bom...Espectacular....
Cumprimentos
Adoro teu diário poético, Ana, uma abertura da alma, uma viagem para dentro, sem descuidar da vida presente. Somos holísticos, que o diga esse mistério que chamamos de memória.
Bjinhos, minha amiga.
Aninha, esta prosa poética levou-me de volta ao tempo das saudades. Obrigada por tanto carinho e sensibilidade nestas palavras!
Deixo-te o meu carinho!
♥
É com ediçõs desta que fico dividido:
Tudo está perfeito, a natureza, no caso do marmelo e dos crisântemos e a romã (Comprei uma este fim de semana no Pingo Doce: estava deliciosa); a doçaria.
Excelente edição, Ana
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