Rara Avis in Terris, JUVENAL, Sátiras, VI, 165

segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

E...as festas acabaram.

 

De volta...

José


E agora, José?

A festa acabou,

a luz apagou,

o povo sumiu,

a noite esfriou,

e agora, José?

e agora, você?

você que é sem nome,

que zomba dos outros,

você que faz versos,

que ama, protesta?

e agora, José?

 

Está sem mulher,

está sem discurso,

está sem carinho,

já não pode beber,

já não pode fumar,

cuspir já não pode,

a noite esfriou,

o dia não veio,

o bonde não veio,

o riso não veio,

não veio a utopia

e tudo acabou

e tudo fugiu

e tudo mofou,

e agora, José?

 

E agora, José?

Sua doce palavra,

seu instante de febre,

sua gula e jejum,

sua biblioteca,

sua lavra de ouro,

seu terno de vidro,

sua incoerência,

seu ódio — e agora?

 

Com a chave na mão

quer abrir a porta,

não existe porta;

quer morrer no mar,

mas o mar secou;

quer ir para Minas,

Minas não há mais.

José, e agora?

 

Se você gritasse,

se você gemesse,

se você tocasse

a valsa vienense,

se você dormisse,

se você cansasse,

se você morresse...

Mas você não morre,

você é duro, José!

 

Sozinho no escuro

qual bicho-do-mato,

sem teogonia,

sem parede nua

para se encostar,

sem cavalo preto

que fuja a galope,

você marcha, José!

José, para onde?



Carlos Drummond de Andrade


23 comentários:

chica disse...

Que bom te ver voltando!,Ana! Essa poesia é linda! E agora? Tudo vem por aí contigo? beijos, tudo de bom,chica

Food Blog disse...

Obrigado por seus comentários em meu blog, espero que você visite meu blog regularmente

brancas nuvens negras disse...

Um poema daqueles que surgem em momentos de grande inspiração.

São disse...

Gosto tanto....

Beijinho, Aninhas, boa semana e excelente votação

Luiz Gomes disse...

José obrigado por trazer a Ana de volta. Boa tarde minha querida amiga Ana.

Fê blue bird disse...

para onde minha amiga, para onde ?

Querida Ana, não podias ter escolhido melhor poema para este teu regresso.
Um regresso por mim muito desejado.

Cuida-te !

beijinho

alfacinha disse...

Que bom esse poema deCarlos Drummond de Andrade
Abraço

Edum@nes disse...

E agora que a festa acabou,
serão tudo coisas do destino
ao confinamento nos obrigou
por causa do virus ser malino!

Só a inspiração do poeta,
poderá circurar em liberdade
no entanto, continuará alerta
até a vida voltar à normalidade!

Com saúde amiga Ana, continuação de boa semana. Beijinho.

Fá menor disse...

Muito belo! Gostei muito. Não conhecia.

Por vezes chegamos a pontos assim, ou parecidos. Há que dar a volta por cima enquanto é tempo.

Beijinhos.

Juvenal Nunes disse...

Um poema muito triste e que apresenta José como um sem-abrigo. A sua leitura não apresenta nenhuma saída airosa para tão triste fado desse cidadão.
Abraço amigo.
Juvenal Nunes

Maria disse...

São Sebastião, livrai_me desta peste que se abateu sobre a humanidade. Livrai_me e livrai minha filha, minha família e toda a terra. Amém!

Mar Arável disse...

Agora?
A luta continua até ser outro dia

SILO LÍRICO - Poemas, Contos, Crônicas e outros textos literários. disse...

É, e agora? - pergunta Ana.
E, agora com a pandemia?
E, agora que a vacina viria
Salvar a espécie humana
Dessa doença tão insana,
Vindo um número pequeno,
Apenas como um aceno
Para dar ao vírus, fim.
Será que a vida é assim?
É remédio ou é veneno?

Abraço cordial! Parabéns pela postagem! Laerte.

Elvira Carvalho disse...

Um poema de que gosto muito.

As festas acabaram. E para muitos de uma forma trágica. Pergunto-me: Valeu a pena, desafiar a sorte?
Abraço e saúde

Olinda Melo disse...


Querida Ana

Fantástico este Poema de Drummond de Andrade.
É para ler e reler. Adapta-se a todos os tempos,
a todas as horas e em especial a estes momentos
aflitivos que estamos a viver.

"A festa acabou/A luz apagou..."

Espero que consigamos reencontrar o equilíbrio.

Beijinhos
Olinda

silvioafonso disse...

Ana, me diga aonde as festas
acabaram, porque aqui, no
país tropical continua tudo
do mesmo jeito, viu?
Um beijo de máscara e bom dia.

Ulisses de Carvalho disse...

uma escolha adequada para o momento.
e para mim as festas nem chegaram a começar...
grande Drummond!
beijo, Ana.

Jaime Portela disse...

Este poema do Drummond é brilhante.
E ajusta-se aos tempos de pandemia que correm.
Bom fim de semana, querida amiga Ana.
Beijo.

CÉU disse...

E que Festas que só trouxeram o agudizar da Covid, em minha opinião.
Já conhecia o poema, tão bem feito e até com humor. E agora o que fazemos todos nós?
O José fez-te uma fotografia muito bonita, mas é pena estares de costas.

Beijinhos, Ana e que a situação pandémica abrande.

Janita disse...

Nada é eterno. E ainda bem que está de volta, Ana. Gostamos de a ter por cá.

Gosto muito desse poema de Drummond de Andrade e até já me inspirei nele para oferecer uma réplica a um meu amigo (pretenso filósofo) que usa o 'pseudónimo' de «Zé da Troucha» numa alusão ao filósofo alemão Friedrich Nietzsche e ao seu livro «Assim Falou Zaratustra».

Tivesse eu os meus postais mais e melhor organizados, com etiquetas mais facilmente acessíveis e indicar-lho-ia com gosto. :)

Um beijinho, Ana e até breve.

Graça Pires disse...

É sempre excelente ler este poema de Carlos Drummond de Andrade. Gostei de o encontrar aqui.
Uma boa semana com muita saúde.
Um beijo.

João Santana Pinto disse...

Gostei muito do poema. A título de curiosidade, ao mesmo tempo que estava a ler, fui sempre a pensar "estou a gostar bastante, mas não me lembro de ver a Ana neste registo, com este ritmo" e arriscando ofender o poema/poeta (algo que não quero), menos "trabalhado", mais espontâneo (se ajudar a recuperar a eventual ofensa.

Tudo isto para dizer, que gosto muito da forma como pintas através da escrita.

Um beijinho para ti

Reflexos Espelhando Espalhando Amig disse...

Ana,
Agora é aguardar
o andamento da carruagem
pedindo a Deus
que nos ajude a ter
paciência.
Bjins
CatiahoAlc.