Jury Annenkov, 1918 |
Faltam alunos na sala. O Sol outonal doura, levemente, o ambiente interior. Uma suavidade na dureza dos dias. A calma, o receio e o entusiasmo do início do ensino secundário alargam o texto até à vila de Avis, aqui tão próxima, e levam, num voo rasante de pássaro deste Sul indomável, até ao silêncio pacífico e cheio do interior da Torre do Tombo, em Lisboa. Fernão Lopes é matéria dura para jovens de quinze anos pós-modernos!
M. não está presente, a irmã mais nova está com covid19 - ela e a turma inteira, confinaram-se. Outros três lugares estão vazios, na pequena sala em que vinte e sete alunos se amontoam atrás das máscaras azuladas. Em anos anteriores, essa prótese ainda tinha laivos de adereço e moda. Agora não! Luta-se pela assepsia, desesperadamente.
O conhecimento encolheu. A Gramática perdeu-se, mesmo se a História da Língua ainda fascina alguns deste alunos de Ciências e Tecnologias. Desdobro-me para cativá-los, como a Raposa no Principezinho de Antoine de Saint-Éxupéry.
- E quando vive, professora?
Todo o dia pensei na interrogação arremessada por esta menina sábia e frágil. Que lição!
Ana
21 comentários:
Interessante relato desses tempos que vivemos e com final instigante...Gostei de ler! Por vezes não conseguem entender como fazemos pra tanto fazer, parece nem vivemso,não é? beijos, chica
Pois é, Ana, é assim que as turmas se apresentam.
Tantas horas que eu passei na Torre do Tombo, onde até tinha um número, como na Biblioteca Nacional de Lisboa.
A pergunta da aluna é perspicaz e inteligente.
Quando? Vamos vivendo.
Beijos e dias com esperança.
Numa, talvez a única, prova oral de português o examinador mandou-me abrir o livro "ao calhas". Saiu-me a crónica de Fernão Lopes (O Cerco de Lisboa) e o texto foi lido com tal fluência que mais parecia ter sido eu o frequentador assíduo da Torre do Tombo...
Quanto à sábia pergunta dessa frágil aluna, gostava de saber mais sobre a resposta que lhe darias...
Beijos, querida "Raposa"
Lindo relato te mando un beso
Realmente, é uma pergunta estranha na boca de uma jovem que deve gostar de ler autores mais maduros...
Porém, a vida é assim -- é importante que se faça o que se gosta, porque não acho aliciante viver em perene ociosidade.
O tempo de lazer tem mais sabor para quem trabalha...
Dias felizes na preparação da sua festa familiar.
Beijinhos
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Vamos assim vivendo um dia atrás do outro, um de cada vez, na ânsia de que nos deixem viver.
Belo relato!
Beijinhos e tudo de bom!
Creio que à jovem, viver
Não é o tempo de vida
Vivido. É a apetecida
Parte em que há prazer
E diversões para o ser
Deleitar-se, unicamente,
Pois só assim o ser sente
Haver vida e que enquanto
Se trabalha não há encanto
Ou nem vida, de repente...
São conjecturas que o raciocínio de Ana, tenha sido esse. É minha crença. Abraço fraterno. Laerte.
Que relato belo .Gostei de ler
Abraço
J. fez a pergunta. E a professora Ana respondeu o quê? As crianças têm uma perspicácia tantas vezes inesperada... Mas gostei da apresentação que fez dos seus alunos. Estudar Fernão Lopes nem sempre é fácil, mas é muito instigante. Deve ser bom ter uma professora que gosta de cativar os alunos. Parabéns, minha Amiga.
Um bom fim de semana.
Cuide-se bem.
Um beijo.
Que respondeste, minha amiga?
Eu penso que quando se faz o que se gosta , o tempo que se lhe dedica é vida!
E parabéns pela educadora que és.
Te abraço com carinho, Aninhas
Um texto muito interessante!
E é verdade que as crianças por vezes, tem perguntas que ficamos a pensar, na resposta adequada a dar.
Gostei bastante do que li.
Boa semana.
Saúde e paz.
Beijinhos
:)
Na sequência da leitura deste seu belo texto, ocorreu-me que eu própria me julguei uma velha pós-moderna, em tempos... :)
Um abraço, Ana!
Grandios und berührend!
Ich umarme dich!
O impacto negativo que a pandemia está a ter no ensino talvez não esteja a ser bem avaliada pela generalidade das pessoas e instituições, nomeadamente pelo ministério/governo.
Mas ainda há professores que lutam para minimizar esse impacto e que ainda têm um tempinho para ir à Torre do Tombo... mas pouco tempo lhes resta para viver...
Continuação de boa semana, amiga Ana.
Beijo.
Muito sábia e certeira a pergunta da menina J.
Como mãe que sou duma professora ( e irmã, e cunhada, e prima... parece que é de família...)
entendo bem a questão.
Gostei muito desta reflexão.
Continuação de boa semana.
Beijinhos
MARIAZITA / A CASA DA MARIQUINHAS
Adenda - Espero vê-la no dia 16 na minha CASA.
Na vida, temos ocupações que nos preenchem a vida
de uma forma assoberbante. E essa tua aluna soube
ler a situação. É a tal verdade na boca das
crianças/adolescentes. Por vezes, vêm as coisas com
uma clarividência espantosa.
Bom fim de semana, querida Ana.
Beijinhos
Olinda
Olá, Ana!
Espero que esteja bem.
Votos de um Santo e Feliz Natal e Bom Novo Ano!
Beijinhos.
Te deseo una feliz navidad
Ana,
cada vez estamos mais distantes uns dos outros e não temos tempo para conhecer a fundo o que está ao nosso redor, criar os tais laços.
"Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas."
Sei que essa tua responsabilidade, cativa e habita no coração desses jovens!
Viver é isso!
Feliz Natal minha amiga!
Um beijinho
Vertiginoso é o rumo a um lugar onde só o vento será raiz.
Urge que a educação seja um momento perene de clarividência, presente todos os dias.
Desejo-lhe um feliz Natal!
Um beijo meu!
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