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| Gate of All Nations, Persepolis, Irão |
quinta-feira, 30 de outubro de 2025
Em que ano estamos?
sexta-feira, 17 de outubro de 2025
Poema do Silêncio, José Régio
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| Ferragudo, Praia Grande - 2025 |
Sim, foi por mim que gritei.
Declamei,
Atirei frases em volta.
Cego de angústia e de revolta.
Foi em meu nome que fiz,
A carvão, a sangue, a giz,
Sátiras e epigramas nas paredes
Que não vi serem necessárias e vós vedes.
Foi quando compreendi
Que nada me dariam do infinito que pedi,
- Que ergui mais alto o meu grito
E pedi mais infinito!
Eu, o meu eu rico de baixas e grandezas,
Eis a razão das épi trági-cómicas empresas
Que, sem rumo,
Levantei com sarcasmo, sonho, fumo...
O que buscava
Era, como qualquer, ter o que desejava.
Febres de Mais. ânsias de Altura e Abismo,
Tinham raízes banalíssimas de egoísmo.
Que só por me ser vedado
Sair deste meu ser formal e condenado,
Erigi contra os céus o meu imenso Engano
De tentar o ultra-humano, eu que sou tão humano!
Senhor meu Deus em que não creio!
Nu a teus pés, abro o meu seio
Procurei fugir de mim,
Mas sei que sou meu exclusivo fim.
Sofro, assim, pelo que sou,
Sofro por este chão que aos pés se me pegou,
Sofro por não poder fugir.
Sofro por ter prazer em me acusar e me exibir!
Senhor meu Deus em que não creio, porque és minha criação!
(Deus, para mim, sou eu chegado à perfeição...)
Senhor dá-me o poder de estar calado,
Quieto, maniatado, iluminado.
Se os gestos e as palavras que sonhei,
Nunca os usei nem usarei,
Se nada do que levo a efeito vale,
Que eu me não mova! que eu não fale!
Ah! também sei que, trabalhando só por mim,
Era por um de nós. E assim,
Neste meu vão assalto a nem sei que felicidade,
Lutava um homem pela humanidade.
Mas o meu sonho megalómano é maior
Do que a própria imensa dor
De compreender como é egoísta
A minha máxima conquista...
Senhor! que nunca mais meus versos ávidos e impuros
Me rasguem! e meus lábios cerrarão como dois muros,
E o meu Silêncio, como incenso, atingir-te-á,
E sobre mim de novo descerá...
Sim, descerá da tua mão compadecida,
Meu Deus em que não creio! e porá fim à minha vida.
E uma terra sem flor e uma pedra sem nome
Saciarão a minha fome.
José Régio, in As Encruzilhadas de Deus
sexta-feira, 3 de outubro de 2025
Dias de Outubro
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| Pandorea jasminoide - Cá de casa - Outubro, 2025 |
domingo, 21 de setembro de 2025
Dia internacional da Paz
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| Pablo Picasso |
COM MAIS DE SESSENTA CONFLITOS ARMADOS NO PLANETA, hoje comemora-se o dia da PAZ.
Pela verdade, pelo riso, pela luz, pela beleza,
Pelas aves que voam no olhar de uma criança,
Pela limpeza do vento, pelos actos de pureza,
Pela alegria, pelo vinho, pela música, pela dança,
Pela branda melodia do rumor dos regatos,
Pelo fulgor do estio, pelo azul do claro dia,
Pelas flores que esmaltam os campos, pelo sossego dos pastos,
Pela exactidão das rosas, pela Sabedoria,
Pelas pérolas que gotejam dos olhos dos amantes,
Pelos prodígios que são verdadeiros nos sonhos,
Pelo amor, pela liberdade, pelas coisas radiantes,
Pelos aromas maduros de suaves outonos,
Pela futura manhã dos grandes transparentes,
Pelas entranhas maternas e fecundas da terra,
Pelas lágrimas das mães a quem nuvens sangrentas
Arrebatam os filhos para a torpeza da guerra,
Eu te conjuro ó paz, eu te invoco ó benigna,
Ó Santa, ó talismã contra a indústria feroz.
Com tuas mãos que abatem as bandeiras da ira,
Com o teu esconjuro da bomba e do algoz,
Abre as portas da História,
deixa passar a Vida!
segunda-feira, 8 de setembro de 2025
Fui criança indo por um carreiro
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| Madalena - agosto 2025 |
Fui criança, indo por um carreiro,
a caminho do mar, mão na outra mão,
entre árvores, pedras, insectos e aves.
Toda a Natureza me coube nas pupilas,
mestra de sentimentos, e eu discípula.
E, se fechava os olhos, ela punia-me
com o silêncio cruel das ondas,
a mudez imerecida dos insectos,
e a distância das aves, que doía.
e os abria, tudo me rodeava,
apaziguado e meu,
mas a mão que me trazia a mão
puxava-me para a luz de cada dia.
Fiama Hasse Pais Brandão
Cenas Vivas, Relógio d’Água
quinta-feira, 28 de agosto de 2025
Tecnopopulismo ou tecnofascismo
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| Newyorker.com |
quinta-feira, 14 de agosto de 2025
Talvez as rosas
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| Cá de casa - Ana |
| Cá de casa - Ana |
sexta-feira, 1 de agosto de 2025
Levantam, num voo rasante
sexta-feira, 25 de julho de 2025
44 anos
Brincas todo o dia com a luz do universo.
Subtil visitante, chegas na flor e na água.
És mais que este pequeno órgão claro que aperto
como um cacho em minhas mãos pelos dias.
A ninguém te pareces desde que te amo.
Deixa eu te deitar entre guirlandas amarelas.
Quem escreve teu nome com letras de fumo entre as estrelas do sul?
Ah deixa eu te lembrar como eras quando ainda nem existias.
De repente o vento uiva e golpeia minha janela fechada.
O céu é uma rede carregada de peixes sombrios.
Aqui vêm dar todos os ventos, todos.
Despe-se a chuva.
Passam fugindo os pássaros.
O vento. O vento.
Só posso lutar contra a força dos homens.
O temporal faz girar folhas escuras
e solta todas as barcas que à noite atracam no céu.
Estás aqui. Ah não me foges.
Responderás até o último grito.
Encolhe-te a meu lado como se tivesses medo.
Lépida uma vez uma sombra estranha percorreu teus olhos.
Agora, agora mesmo, pequena, trazes-me madressilvas,
e trazes ainda os seios perfumados.
Enquanto o vento triste galopa matando mariposas
eu te amo, e minha alegria morde tua boca de ameixa.
Quanto te doerá acostumares-te a mim,
à minha alma solitária e selvagem, ao meu nome que afastam.
Vimos tantas vezes a lamparina arder beijando nossos olhos
e sobre nossas cabeças desdobrarem-se os crepúsculos em leques gigantes.
Minhas palavras choveram em ti, acariciando-te.
Há tempos amei teu corpo de nácar ensolarado.
Até te vejo dona do universo.
Te trarei das montanhas flores alegres, campânulas,
avelãs escuras e cestas selvagens de beijos.
Quero fazer contigo
o que a primavera faz às cerejeiras.
| 44 anos de casamento |
domingo, 20 de julho de 2025
Calema
| Fontana dei Quattro Fiumi (Fonte dos Quatro Rios) - Roma - José Alves |
Hei-de enfrentar teimosamente o Futuro.
Defenderei até ao fim a Verdade,
Porque a Justiça é o meu ideal mais duro,
Porque o meu peito traz consigo a Vontade!
Serei a criança, sorrirei às estrelas,
Porque existem coisas belas, hei-de defendê-las.
Ainda que me apontem o dedo em riste...
Irei dizer que a Vida ainda existe!
Calema, sob o verde das águas, cresce...
Abril já partiu e os homens hoje oraram,
Mas secretamente Setembro decresce...
No fulgor dos impérios que naufragaram.
Ana
Calema - Ondulação forte do mar, nas costas de África que causa forte rebentação.
(https://dicionario.priberam.org/calema)
Fonte dos quatro rios (Roma) -quatro rios mais importantes de diferentes continentes: o Nilo (África), o Danúbio (Europa), o Ganges (Ásia) e o Rio da Prata (Américas
sábado, 12 de julho de 2025
Às vezes, a ternura...
terça-feira, 1 de julho de 2025
Quarenta graus
domingo, 29 de junho de 2025
Extremo
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| Bernardo Strozzi, "As três Parcas" |
Oligarcas
segunda-feira, 23 de junho de 2025
Que estamos a fazer da Humanidade?
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| Cá de casa - Ana, 2025 |
É esta a hora perfeita em que se cala
O confuso murmurar das gentes
E dentro de nós finalmente fala
A voz grave dos sonhos indolentes.
É esta a hora em que as rosas são as rosas
Que floriram nos jardins persas
Onde Saadi e Hafiz as viram e as amaram.
É esta a hora das vozes misteriosas
Que os meus desejos preferiram e chamaram.
É esta a hora das longas conversas
Das folhas com as folhas unicamente.
É esta a hora em que o tempo é abolido
E nem sequer conheço a minha face.
Sophia de Mello Breyner Andresen, Dia do Mar, 1947 (Poema com referência aos poetas sufis da Pérsia, Saʿdī e Ḥāfiẓ)
Os meus amigos, que por aqui andam há mais tempo, sabem que tive uma viagem planificada para o Irão/Iraque no Verão de 2020, tendo no ano de 2019 percorrido Israel, territórios disputados, Cisjordânia, com uma incursão nos montes Golã...
O projecto por cumprir ficou aqui: "Um chá na Pérsia"
https://raraavisinterris.blogspot.com/2020/01/um-cha-na-persia.html
Conservo esse sonho de um dia ir à velha Pérsia. Não visito países, corro atrás da História. Do resto, falaremos depois...
Num relance à mais banal das fontes, percebemos o que a, dita, conquista islâmica fez aos velhos textos persas...eles, sim, repositórios dos antigos preceitos, mitos e lendas sobre os quais construímos o nosso saber de europeus do Sul.
| Pois...os persas não são árabes. |
terça-feira, 10 de junho de 2025
O Portugal Futuro
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| Lagos, 2024 - Ana |
aonde o puro pássaro é possível
e sobre o leito negro do asfalto da estrada
as profundas crianças desenharão a giz
esse peixe da infância que vem na enxurrada
e me parece que se chama sável
Mas desenhem elas o que desenharem
é essa a forma do meu país
e chamem elas o que lhe chamarem
Portugal será e lá serei feliz
Poderá ser pequeno como este
ter a oeste o mar e a Espanha a leste
tudo nele será novo desde os ramos à raiz
À sombra dos plátanos as crianças dançarão
e na avenida que houver à beira-mar
pode o tempo mudar será verão
Gostaria de ouvir as horas do relógio da matriz
mas isso era o passado e podia ser duro
edificar sobre ele o Portugal futuro
Ruy Belo
sexta-feira, 6 de junho de 2025
A guerra terá um fim
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| "Alegoria da Guerra", Brueghel |
Os líderes trocarão apertos de mãos.
A idosa continuará
esperando pelo filho martirizado.
Aquela moça vai esperar pelo
amado marido.
E essas crianças esperarão
por seu heróico pai.
Não sei quem vendeu nossas terras.
Mas eu vi quem pagou o preço.
quinta-feira, 29 de maio de 2025
Florescer no deserto
| Deserto do Neguev, 2019 |
domingo, 11 de maio de 2025
Abandonos
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| https://prehistoricportugal.com/megaliths/ |
Andamos por aí, sempre foi assim. Somos andarilhos natos. Sê-lo-emos, decerto, enquanto as pernas o permitirem. Tu apaixonas-te pela História e eu inebrio-me com os sons, os odores, o silêncio, os encantamentos de uma luz coada sobre a planície. Depois, escuto-te e enriqueço.
Lamentamos o abandono a que vão sendo soltos os lugares: capelas caídas, sítios megalíticos empilhados depois das sucessivas lavouras e, mesmo quando anunciados em rotas turísticas, acessos que a invernia vai tornando inacessíveis. Como é possível? Como é possível que Évora não core de vergonha perante o estado a que chegou o acesso ao Cromeleque dos Almendres? Sete mil anos deixados ao acaso, repletos de turistas e de estudiosos...
| Ana - Maio 2025 |
| Ana - Maio 2025 |
Valha-nos a beleza do montado...
terça-feira, 6 de maio de 2025
Céu Plúmbeo
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| Bettina Baldassari |
Olha, no céu plúmbeo, uma pomba
voa serena sobre o verde e as flores.
Anda, retira de tua alma as dores
e aspira o polén de vida que tomba.
Que tomba da corola solene e bela
e perfuma o cinzento de silêncio e ar!
Leva doçura à alma eleita para amar,
traça, com tuas mãos, a felicidade singela.
Singela na beleza e o seu raio inunda
a alma triste onde a saudade dói...
com ecos de lonjura, fera e rotunda!
Plúmbeo o céu, o Sol, o cinzento destrói.
E não temas, tu és a razão profunda...
Ama! Pois, afinal, a vida se constrói.
Ana Tapadas, Sul Sereno, editora Europa, 2024, p. 38
quinta-feira, 24 de abril de 2025
Estarei ali...algures! Teria dezasseis anos feitos há pouco.
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| Fernando Correia, Abrantes, 1974 |
| Fernando Correia, Abrantes, 1974 |
Este dia é um canteiro
com flores todo o ano
e veleiros lá ao largo
navegando a todo o pano.
E assim se lembra outro dia febril
que em tempos mudou a história
numa madrugada de Abril,
quando os meninos de hoje
ainda não tinham nascido
e a nossa liberdade
era um fruto prometido,
tantas vezes proibido,
que tinha o sabor secreto
da esperança e do afecto
e dos amigos todos juntos
debaixo do mesmo tecto.
José Jorge Letria
quarta-feira, 16 de abril de 2025
"Chamo-Te porque tudo está ainda no princípio"
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| Alentejo, 2025 |
Chamo-Te porque tudo está ainda no princípio
E suportar é o tempo mais comprido.
Peço-Te que venhas e me dês a liberdade,
Que um só dos Teus olhares me purifique e acabe.
Há muitas coisas que eu não quero ver.
Peço-Te que sejas o presente.
Peço-Te que inundes tudo.
E que o Teu reino antes do tempo venha
E se derrame sobre a terra
Em Primavera feroz precipitado.
segunda-feira, 31 de março de 2025
Cyclamen de Alepo
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| cyclamen cá de casa, 2025 |
Cantos para o amor
1
um eco de ti me disse:
“o segredo que fala de ti e de mim
não tem idade”
2
sabemos como podem amar as estações
sabemos que línguas falaram
no desconhecimento do vento e do espaço
3
não tenho medo
devo inventar o testemunho que
te corresponde
Entre teus olhos e eu
vejo a alvorada profunda
vejo o antigo ontem
vejo isso que ignoro
e sinto que passa o universo
entre os teus olhos e eu
Unidade
suas pálpebras cobrem com as minhas
o universo ligou-se à minha liberdade,
qual dos dois criou o outro?
domingo, 16 de março de 2025
Por Decreto...ou as "soft girls"
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| Serra de São Mamede, Portalegre - 2025 |
Corro na paisagem e no tempo húmido desta inefável respiração da Terra, corro nos dias de Março. Já foi "dia das mulheres" e eu, por aí, vou pensando em como me viram...ou me imaginam. Foi-me concedida a afirmação social, pela qual outras mulheres tanto lutaram.
Não serei sempre inefável, especialmente como agora, deslizando por este Alentejo brumoso. Serei engendrada dessa diferença granítica que se esconde e às vezes se assoma na paisagem, ao redor. Com atenção redobrada, vou guiando sem gosto - sob a chuva ameaçadora - veículo avantajado, cabelos desgrenhados e botas pesadas. Alentejana sou.
| Ana Maria, 2025 |
| ESCUTA A MINHA DIFERENÇA |
("Sobre a minha feminilidade”, disse ela, “nunca tive complexos nem inferioridade nem superioridade. E muito menos de igualdade.")












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